Nos últimos anos, Angola tem registado melhorias no combate à corrupção. E ocupa agora o lugar 121 no atual Índice de Perceção da Corrupção, entre 180 países e territórios analisados, anunciou esta terça-feira a Transparência Internacional.
Segundo a organização não-governamental com sede em Berlim, Angola adotou medidas anticorrupção, que aplicou para recuperar bens e ativos roubados e também responsabilizou os alegados autores através dos sistemas judiciais.
Em entrevista à DW, o coordenador da ONG angolana Omunga reconhece que tem havido mudanças, mas lembra que a corrupção continua a existir, o que mudou foi o "modus operandi". João Malavindele lembra que continua a não haver transparência e também não se sabe onde está a ser aplicado o dinheiro recuperado.
DW África: Considera que houve avanços em Angola no combate à corrupção?
João Malavindele (JM): Desconheço quais são os critérios usados para chegar a esta conclusão, mas temos notado um esforço do Executivo relativamente ao fenómeno corrupção, olhando sobretudo para os discursos. Houve avanços, não diria tanto do ponto de vista qualitativo, mas essencialmente do ponto de vista quantitativo.
Se olharmos, por exemplo, para a legislação de combate à corrupção, incluindo a lei de recuperação de ativos, houve uma melhoria. Hoje em dia, se calhar, o gestor público tem mais cuidado na gestão da coisa pública. Mas isso não significa o fim da corrupção. Mudou-se apenas o modus operandi.
DW África: A política de combate à corrupção de João Lourenço está a ganhar um novo ímpeto, com ações concretas, como referiu, de recuperação de ativos e o processo contra a empresária Isabel dos Santos. Os Estados Unidos também elogiaram Angola pela política de combate à corrupção. Acha que há também aqui uma tentativa de, de certa forma, agradar ao Ocidente?
JM: Essa é uma análise que cada um vai fazendo também de acordo aos seus interesses. Mas a sociedade civil em Angola continua a olhar com preocupação para a questão dos concursos públicos e das grandes obras, com a adjudicação direta feita pelo titular do poder executivo, que gera um clima de suspeição. Mesmo a questão da recuperação de ativos... Até hoje, não se sabe quanto é que se recuperou nem como é que esses recursos estão a ser gastos, tudo aquilo que foi recuperado.
Acho que o combate à corrupção devia ser muito mais inclusivo, para que todas as forças vivas da sociedade pudessem ter uma palavra a dizer sobre a forma como está a ser feito. Não esqueçamos que a corrupção está enraizada nas instituições.
DW África: As mudanças anunciadas não se refletem no dia a dia das pessoas?
JM: A forma como tem sido abordada a questão da corrupção tem, de certa forma, contribuído para o sofrimento e para a pobreza dos cidadãos. É claro que nós queremos que tudo o que foi retirado ao Estado de forma ilícita volte para a esfera do Estado. Mas tudo o que for recuperado deve ter um efeito positivo na vida das pessoas, seja comprando medicamentos para os hospitais, pondo as estradas a funcionar e aumentando o acesso à água potável. Criando todas as condições sociais para dar maior dignidade aos cidadãos.
Passados cinco ou seis anos de combate à corrupção, já se devia sentir isso, mas a verdade é que não se sente. Nós temos assistido, por exemplo, ao leilão dos bens recuperados, mas volta e meia, são as mesmas pessoas que acabam por adquirir os tais bens.
Não ponho em causa o estudo apresentado pela Transparência Internacional – é um estudo que vem mais no sentido de alertar os cidadãos – mas pode criar a ideia de que está tudo bem em Angola. Não é assim. DW África