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Terça, 16 Junho 2020 16:55

Isabel dos Santos meteu o Candando no jogo de xadrez

O arresto dos bens da empresária por parte do Tribunal Provincial de Luanda abalou o seu prestígio, mas a ameaça de despedimentos na rede de híperes do Candando foi uma jogada inesperada que fez soar o alerta no Governo angolano.

O jogo tático que se desenvolveu à volta do fecho dos hipermercados angolanos Candando é a prova de que o Presidente João Lourenço não é o único exímio xadrezista no tabuleiro do poder do país. Com o país a viver uma crise económica provocada pela coligação negativa da pandemia de covid-19 e da queda do preço do petróleo, o emprego tornou-se ainda um bem mais essencial e foi com este cavalo que Isabel dos Santos fez xeque ao Governo.

A 9 de junho, a empresária angolana admite em declarações ao jornal angolano Valor Económico o encerramento de metade dos hipermercados Candando. Ou seja, fechariam quatro unidades e mil dos 2.000 trabalhadores seriam dispensados.

Dois dias depois o próprio Candando, em comunicado, esclarece que “após a circulação de notícias nos meios de comunicação, dando conta da intenção (…) em encerrar parte da sua rede de lojas e proceder ao despedimento de vários dos seus colaboradores” e tendo em conta as dificuldades causadas pelo arresto dos bens da sua acionista, Isabel dos Santos, “apresentou um plano de revitalização, e solicitou o apoio às entidades competentes neste sentido tendo, entretanto, já tido a oportunidade de expor a sua situação junto do Ministério do Comércio”.

Finalmente, a 11 de junho, o Ministério da Indústria e Comércio angolano diz ter recebido a garantia do Candando de que não existirão despedimentos no grupo mas é omisso quanto ao referido plano de revitalização.

Ao contrário do que é habitual, durante todo este processo do Candando, Isabel dos Santos prescindiu do uso do Twitter e Instagram, redes sociais que a empresária tem usado para fazer a sua defesa.

O dilema do Governo

As afirmações ao Valor Económico (nunca desmentidas pela própria) ganharam asas e permitiram que a empresária, através de uma terceira pessoa, neste caso o Candando, sublinhasse os méritos e a transparência do seu investimento. “O projeto Candando é um investimento privado, e foi na sua integralidade pago e financiado pelos seus acionistas e pela banca comercial, nomeadamente pelos Banco BIC, Banco BAI, Standard Bank, Banco Millenium Angola, não tendo tido qualquer tipo de apoio do erário público, nem qualquer aporte de fundos do estado angolano”, lê-se no referido comunicado.

Qualquer anúncio empresarial que se traduza numa perda de postos de trabalho coloca o Governo sob pressão. Longe vão os tempos da campanha eleitoral, durante a qual João Lourenço prometeu a criação de 500 mil empregos. A crise, não só tornou este número numa miragem, como também fez crescer a percentagem dos desempregados. Em abril de 2019, esta situava-se em 28,8% da população ativa e no último trimestre do mesmo ano já atingia 31,8%, um quadro que a covid-19 ainda terá agravado embora não existam dados oficiais.

Ao jogar com a ameaça de mais desemprego, Isabel dos Santos colocou o Governo perante um dilema: ou deixa que o mesmo se concretize e fica com mais um problema entre mãos que afetará muitas famílias e provocará tensões sociais, ou ajuda o Candando e, ao fazê-lo, legitima este investimento e a sua natureza privada, dando assim armas para a batalha judicial da empresária.

Aguardam-se as próximas movimentações neste jogo cada vez mais complexo. Jornal de Negócios

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