Ventura, em seu encontro com o político moçambicano VM7, já tinha declarado que a imigração decorre da pobreza causada por governos corruptos em Angola, ou seja, a forma do seu ataque a JLO já estava politicamente formulada antes da entrevista deste na CNN.
Sendo por isso que os portugueses que defendem as palavras de Ventura, como sendo apenas uma resposta “à ingerência de JLO”, inverteram a ordem dos factos.
Está claro que Ventura está a tentar incitar um reflexo nacional: afinal, “os nossos antigos caxicos, cujo país governámos melhor, que agora vivem na miséria e sob ditadura, nos dar ordens!”, em exagero, foi este o discurso de muitos Cheganos que eu ouvi aqui nas redes.
Quais foram as palavras de JLO?
Respeita a soberania de Portugal, que “pode escolher quem deixa entrar em seu país”.
Pede respeito pelas normas internacionais, “o que se faz internacionalmente em matéria de imigração”.
Que se respeite o princípio de reciprocidade, “que Portugal trate os imigrantes do mesmo jeito que se tratam os seus emigrantes”.
Frase de presidentes Europeus que seguem a mesma formula:
“A França respeita a soberania dos Estados Unidos, mas defende o multilateralismo e os compromissos assumidos no Acordo de Paris.” ?? Emmanuel Macron (França)
“Devemos tratar os nossos vizinhos com o mesmo respeito com que gostaríamos de ser tratados. A cooperação é construída sobre reciprocidade e confiança.” ?? Frank-Walter Steinmeier (Presidente da Alemanha)
“A Espanha defende uma política migratória coordenada com os nossos vizinhos do sul, baseada no respeito mútuo, no controlo das fronteiras e no desenvolvimento partilhado.” ?? Pedro Sánchez (Espanha, primeiro-ministro)
“Portugal respeita a soberania e integridade territorial da Ucrânia e atua em conformidade com os princípios internacionais que sempre defendeu.” ?? Marcelo Rebelo de Sousa (Portugal)
Uma resposta genérica, que o próprio JLO disse que era genérica. Qualquer presidente do mundo usa esta fórmula ao falar sobre diversos assuntos.
Ingerência seria lamentar a subida de partidos de extrema-direita, coisa que os líderes europeus fazem toda a hora, chegando ao ponto de sabotar vitórias eleitorais de partidos contra a imigração.
Ao dizer que os africanos emigram por causa da pobreza de seus países de origem, causada por “ditador sanguinário JLO”, Ventura reforça o mito esquerdista da imigração humanitária, pois existia pobreza antes da onda atual de imigração; o que aconteceu foi uma mudança de lei.
Se a imigração foi causada pela pobreza, logo nunca vai ter um fim, porque a pobreza não vai acabar hoje, e nunca vai ter solução política, por ser um problema económico.
A segunda consequência dessa linha de pensamento está em internacionalizar um problema nacional, pois, se o problema da imigração tem sua origem na pobreza dos países de origem, a mudança de regime nesses países se torna uma necessidade.
Em contrapartida, os governos dos países de origem dos imigrantes ganham o direito de intervir em Portugal para combater este movimento político que os ataca…
O princípio de reciprocidade: se apoias rebeldes contra o meu país, tenho o direito de apoiar rebeldes contra o teu.
O Ventura concorre para ser primeiro-ministro; como nem sabe as formas da linguagem diplomática, como que se dá o direito de insultar o presidente de outro país? Ditador? Sanguinário?
A carreira de Ventura existe por alegar que os portugueses não têm a sua vontade ouvida, ou seja, vivem sob uma ditadura que não tem rosto ou nome, que lhes impõe uma imigração sem fim.
Ventura deveria se preocupar com esta ditadura em casa, ao invés de procurar ditadores fora.
Quanto aos Cheganos, muitos deles, em sua defesa ao Ventura, se regozijavam ao lembrar aos angolanos que “se vivia bem antes da independência”, com o prazer do herdeiro falido que encontra finalmente alguém mais pobre do que ele…
Angola pode ser um país pobre, mas é um país independente.
Há angolanos que celebram as palavras de Ventura porque este está alinhado com suas opções políticas, certamente legítimas; porém, a luta política não pode ser feita na base de mentiras e à custa da paz entre os povos e dentro dos povos, com este discurso incendiário.
Ventura poderia ter dito: “Entendo a preocupação do Presidente JLO, e creio que Portugal deveria seguir o seu exemplo no combate à imigração ilegal, pois expulsou 500.000 pessoas na Operação Transparência de 2019 e tem uma lei da nacionalidade que podemos imitar.”
Dizendo isto, teria movido a Janela de Overton sobre imigração, dando aos portugueses exemplos concretos de outros países sem causar inimizades desnecessárias. Porém, o desejo de se sentir superior diante do africano falou mais alto.
Os Cheganos devem entender que criticar Ventura não significa criticar Portugal, só por ele ser um nacionalista. Afinal de contas, barbaridades iguais ditadas por Ana Gomes, que é de esquerda, teriam o mesmo efeito.
Sobre o uso da palavra sanguinário, que significa ter prazer em derramar sangue e ser feroz, pode o Ventura dar um exemplo concreto?
“sanguinário”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2025.
Nem consegue; foi apenas uma invectiva. Sendo assim, parece que, depois de tantos anos a ser chamado de fascista, racista e nazista sem provas, o Ventura interiorizou o expediente.
O mais curioso nesta história?
JLO provavelmente concorda com Ventura em matéria de imigração ilegal — não por palavras apenas, mas porque, nos atos, ele faz aquilo que o Ventura sonha fazer.
Para se ter uma ideia do que seria um líder sanguinário, recomendo a leitura dos livros de R. J. Rummel sobre violência política.
Por Roboredo Garcia