Quarta, 05 de Novembro de 2025
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Quarta, 05 Novembro 2025 21:01

"O MPLA não conseguirá calar as vozes críticas"

O MPLA já prepara o terreno para as próximas eleições gerais. Analistas ouvidos pela DW África afirmam que o partido se mostra cada vez menos tolerante a vozes críticas à atual liderança.

Ainda falta cerca de um ano e meio para as próximas eleições gerais em Angola, mas a corrida à liderança do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) já mexe nos bastidores. "E de que maneira", afirma o analista político Agostinho Sikatu, diretor do Centro de Debates e Estudos Académicos, em Luanda.

Segundo Sikatu, o MPLA, assim como os demais partidos tradicionais em Angola, não aceitam vozes divergentes. Exemplo disso é a recente expulsão do "camarada" Valdir Cónego, que tinha ousado criticar, em público, o Presidente João Lourenço.

"A expulsão de Valdir Cónego do MPLA representa a vontade de um grupo que se apoderou do Presidente João Lourenço para satisfação dos seus interesses. É o mesmo grupo que se tinha apoderado do Presidente José Eduardo dos Santos. E este grupo não permite vozes contrárias dentro da organização. Qualquer chamada de atenção que algum membro faça é interpretada como uma afronta à liderança, e o membro que assim proceder corre o risco de ser afastado imediatamente. No caso do Valdir Cónego foi uma expulsão. Mas há casos de assinato de caráter. Cria-se um grupo para desacreditar tudo aquilo que essa pessoa diz."

Tática do MPLA "tende a falhar"

Outro analista ouvido pela DW sobre o tema, Celestino Lumbungululo, do Instituo Médio Politécnico (IMD) "Luz do Saber", confirma a tese de que o MPLA está a tentar calar vozes críticas a nível interno. No entanto, afirma: essa tática tende a falhar.

"O MPLA não conseguirá calar as vozes críticas. As vozes contraditórias continuarão a ecuar. Considero que as medidas que o MPLA está a tomar não são certas. Seria importante que o partido sentasse à mesa e discutisse com todos os atores, assim teríamos uma voz muito mais impactante no partido", defende Lumbungululo.

Neste contexto, destaque para duas outras vozes discordantes da linha oficial do MPLA, nomeadamente as do General Higino Carneiro e de António Venâncio.

"António Venancio e Higino Carneiro são aqueles que se apresentam hoje como alternativas para a liderança do MPLA. Higino Carneiro aparece como um potencial sucessor de João Lourenço no próximo congresso. Se ele conseguir chegar ao congresso e se candidatar à presidência do partido, a corrida poderá ser bastante renhida. António Venâncio é uma das figuras com credibilidade e aceitação, apesar de se ter criado todo o cenário para desacredita-lo."

João Lourenço procura "delfim"?

Qual a tática que o MPLA terá escolhido para se manter no poder numa conjuntura política e social que se adivinha muito difícil? Segundo Agostinho Sikatu, João Lourenço, e a ala reinante do MPLA que o apoia, poderão sentir-se inclinados em instalar um denominado "delfim", como cabeça de lista do MPLA, e portanto como candidato a Presidente da República, mantendo João Lourenço na liderança do partido, tendo em conta o facto de Lourenço estar consitucionalmente impedido de se candidatar a um terceiro mandato como chefe de Estado.

"Em Angola, na maior parte dos partidos políticos, o presidente do partido é automaticamente o candidato a Presidente na República nas eleições. O MPLA fez uma alteração no congresso extraordinário anterior, que prevê que o presidente do partido não é necessáriamente o candidato a Presidente da República. Portanto o plano é criar uma bicefalia, para manter João Lourenço na estrutura do poder. Se eventualmente o candidato que o partido indicar ganhar as eleiçoes ele, enquanto líder do partido, poderá dirigir o país através do partido. O presidente do partido praticamente vai ter o poder sobre o Presidente da República", explica Sikatu.

Celestino Lumbungululo concorda com a análise de Agostinho Sikatu. João Lourenço tentará manter-se com as rédeas na mão, entregando a Presidência da República a um homem (ou uma mulher) da sua confiança, mas continuando a "mexer os cordelinhos" através do partido MPLA. Lumbungululu é, no entanto, da opinião que tal procedimento por parte do Presidente da República seria ilegal.

"Na limitação de mandatos, João Lourenço também está limitado a ter um terceiro mandato. Nessa vertente, João Lourenço não pode manter-se na liderança, quer na liderança do MPLA, quer da República de Angola. O MPLA tem de criar uma democratização interna do seu próprio partido", defende Lumbungululo.

Todas estas equações, segundo o analista Agostinho Sikatu, só funcionarão se o MPLA conseguir ganhar as eleições, tarefa que não se afigura muito fácil perante o cenário económico e social considerado desastroso por muitos observadores.

E se o MPLA não ganhar as eleições de 2027? "Se o MPLA não ganhar as eleições essa equação poderá sair muito cara. Nese caso, João Lourenco não poderá ter o controlo sobre o outro candidato", conclui Agostinho Sikatu.

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