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Terça, 28 Janeiro 2020 22:03

Arguidos portugueses só serão julgados em Angola se quiserem

PGR angolano diz querer julgar os portugueses envolvidos no Luanda Leaks em Luanda, mas o acordo com Angola não permite extradição de portugueses. Processo pode ser julgado em Lisboa

Os três portugueses implicados no processo-crime instaurado em Angola por suspeitas de gestão danosa na Sonangol só serão julgados naquele país africano se quiserem. O acordo de extradição entre Portugal e Angola não prevê a entrega 
à força de cidadãos nacionais ao outro país.

Por exemplo, quando Manuel Vicente, ex-vice-presidente de Angola e administrador da Sonangol, foi acusado em Portugal de branqueamento e corrupção no processo que envolvia o procurador Orlando Figueira, recusou-se sempre a ser julgado em Portugal. E foi um tribunal português — a Relação de Lisboa — a dar-lhe razão e a obrigar o tribunal onde decorria o julgamento a enviar o processo para Angola.

Em entrevista ao jornal Expresso, Hélder Pitta Grós é questionado sobre a intenção das autoridades do país, considerando que Angola pediu para Manuel Vicente, ex-ministro angolano que foi visado num inquérito da justiça portuguesa ser julgado no país.

“Nós achamos que deveriam ser julgados em Angola, agora não sabemos qual será a posição que o Governo português virá assumir”.  No entanto, o acordo de extradição entre os dois países não prevê a entrega de cidadãos contra a sua vontade, pelo que tal cenário só se colocará se os três portugueses envolvidos nesta investigação não se opuserem.

Pitta Grós, que esta semana se encontrou com a Procuradora-geral da República portuguesa para discutir o caso, indica que até agora não houve nenhuma declaração de Portugal no sentido de reivindicar o julgamento dos três portugueses que foram constituídos arguidos por suspeitas de gestão danosa na Sonangol: Mário Leite da Silva, considerado o braço direito da empresária angolana, Paula Oliveira, que aparece como acionista de uma empresa que recebeu uma transferência da Sonangol, e Sarju Raikundalia, que era administrador financeiro petrolífera angolana quando Isabel dos Santos estava na presidência. Um quarto arguido, Nuno Ribeiro da Cunha, responsável pelo private banking do EuroBic, morreu entretanto.

Este é o principal caso em investigação pelas autoridades angolanas, mas Pitta Grós na sua passagem por Portugal falou em outras suspeitas. O procurador angolano deu aliás várias entrevistas a falar sobre este caso. E afirmou que a justiça quer esgotar todos os procedimentos para notificar a empresária angolana Isabel dos Santos antes de pedir um mandado internacional de captura. Pitta Grós, que se reuniu com a sua homóloga portuguesa, Lucília Gago, esta quinta-feira, falava em entrevista à Lusa.

“Primeiro vamos esgotar a possibilidade de notificá-la: se não for em Portugal será no Reino Unido [onde também tem residência]. Vamos esgotar essas possibilidades para depois podermos avaliar a aplicação de outra medida”, disse Pitta Grós.

A empresária terá estado na quinta-feira em Lisboa e continua com total liberdade de circulação, algo que Pitta Grós considera normal, tendo em conta a fase do processo. “Em relação aos seus movimentos nada podemos fazer, porque não há medidas de coação no âmbito do processo-crime. Só depois de ela ser interrogada é que lhe poderá ser ou não aplicada” uma medida de coação, afirmou.

Para já, a Interpol ainda não foi contactada por Luanda nem foi pedido um mandado internacional de captura. “[Primeiro], temos de cumprir os pressupostos processuais. Ela ainda não foi notificada desse despacho”, explicou o procurador, acrescentando que só se não “comparecer nesse interrogatório” é que poderá “ter de seguir por essa via”.

Por enquanto, será pedida cooperação judiciária internacional para notificar a empresária que tem passaporte russo: “Teremos de ir a países onde haja interesses neste processo, interesse em notificar [Isabel dos Santos], interesse em possíveis investimentos ou dinheiros que, de forma ilícita, tenham ido para esses países”.

PGR de Angola admite recorrer à Europol e Interpol para investigações

O PGR de Angola disse também que poderá recorrer à Interpol e Europol, e a outros tipos de cooperação internacional, para as investigações de processos em curso ou que possam surgir.

“Quando há necessidade de recorrer à cooperação internacional temos que usar todos os instrumentos legais que existem e, portanto, Interpol, Europol e tudo o que for necessário iremos utilizar”, afirmou à Lusa Helder Pitta Grós.

Até agora, garantiu que não recorreu a essas autoridades policiais: “Neste momento, ainda não o fizemos”, mas “quando for necessário faremos isso”. Para o PGR angolano, Angola “está numa fase inicial de investigação aos factos que foram revelados recentemente”, referindo-se às suspeitas de desvios de dinheiro por parte da empresária angolana Isabel dos Santos.

Por isso, Hélder Pitta Grós admitiu que a PGR angolana tem pedido apoio, até mesmo de técnicos, a outros países na área da investigação. As férias judiciais, que ocorrerão em março em Angola, que acabam por suspender os prazos são, porém, para o PGR uma vantagem que a justiça angolana pode ter neste processo. “Em termos práticos até ocorrem num bom momento para nós. Dá-nos mais tempo para a elaboração da ação principal, de podermos fazer uma ação melhor estruturada, melhor argumentada”, porque as férias acabam por suspender os prazos, referiu o procurador-geral.

Por outro lado, Pitta Grós assegurou que a justiça angolana está disponível para fornecer todos os dados necessários a outros países, nomeadamente Portugal, para que possam prosseguir as investigações.

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