Sábado, 19 de Julho de 2025
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Sábado, 19 Julho 2025 20:07

Quando o amor ao partido cala a consciência

Nos últimos dias, tem circulado pelas redes sociais vários flyeres convocando manifestações pacíficas em diferentes províncias do país. Essas mobilizações são uma continuação direta da manifestação do dia 12 de Julho, realizada em Luanda, que, com toda legitimidade, denuncia o impacto devastador da subida dos combustíveis sobre o custo de vida dos transportes e da cesta básica.

Essas manifestações não são apenas actos de protesto, são também expressões de cidadania e resistência diante de políticas públicas que fragilizam ainda mais o tecido social. Elas servem para lembrar ao governo que a sustentabilidade social não se faz apenas com discursos bonitos, mas com medidas concretas que aliviem o sofrimento de todos, militantes, não militantes, simpatizantes, e até os neutros, essa maioria silenciosa que assiste ao colapso diário da dignidade.

O que surpreende e envergonha é a postura de alguns militantes que, em vez de ouvirem o povo, optam por organizar contra-manifestações ou infiltrar-se nos protestos com o objetivo claro de desestabilizar acções que são não só legais, como protegidas pela Constituição da República de Angola. É o amor irracional ao partido que supera a racionalidade cidadã. Militantes que esquecem que são, antes de tudo, cidadãos. Quando se ama mais um partido do que o próprio país, a linha entre militância e cegueira ideológica desaparece.

É preciso recordar que o Estado está acima dos partidos políticos, e não o contrário. Confundir governo com partido, e partido com nação, é um erro perigoso que mina a construção de um país verdadeiramente democrático.

A Procuradoria-Geral da República e as forças de segurança devem assegurar a proteção dos manifestantes pacíficos e impedir a acção de provocadores. Quando a polícia se alia ao medo do poder em vez de proteger um direito constitucionalmente protegido, todos perdem inclusive os próprios agentes, que também enfrentam o mesmo custo de vida contra o qual o povo se manifesta. Repito- A Procuradoria-Geral da República e as forças de segurança têm o dever constitucional de proteger os manifestantes pacíficos e impedir que forças alheias saboteiem a livre expressão dos cidadãos.

A vergonha de um militante apaixonado é visível quando ele defende o indefensável, mesmo que isso custe o pão da sua própria família. Porque, no final, a subida do preço do gasoleo afeta a todos, mesmo os que gritam slogans partidários com fervor, mas sentem no bolso a mesma dor do povo.

Quando o amor ao partido exige que se cale diante da injustiça, o resultado é um cidadão envergonhado de si mesmo.

Se queremos construir um país digno, precisamos de cidadãos militantes ou não que tenham consciência crítica, e não de fanáticos obedientes. Porque, no fim do dia, todos precisamos do mesmo pão na mesa, transporte acessível e um futuro melhor.

Por Rafael Morais

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