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Sábado, 19 Julho 2014 14:16

Os bastidores da vida de um dos homens mais poderosos de Portugal

Ricardo Salgado tomou a decisão em Luanda, numa visita em outubro de 2000. Estava na hora de abrir um BES em Angola e o encontro com o presidente José Eduardo dos Santos tinha deixado os alicerces definidos e o convite a Álvaro Sobrinho seguir-se-ia.

Dois anos depois, em Janeiro de 2002, nascia o BESA, Sobrinho e Salgado passavam a reunir duas vezes por mês para gerir e definir o rumo do banco, central no plano de internacionalização. E os primeiros anos correram de feição - em 2009, Sobrinho começou por colher os frutos de ter vendido, por 254 milhões de euros, 24% do banco angolano à Portmill, uma empresa supostamente detida por figuras próximas da presidência angolana. O que se seguiria seria bem mais polémico. O Ministério Público português viria a abrir, em Março de 2011, uma investigação que acabaria por arquivar, pouco mais de um ano depois, por ser incapaz de determinar a origem dos milhões que tinham sido trocados por 24% do banco. O primeiro sinal de uma crise que se anunciava inevitável e que está agora contada em "O último banqueiro, Ascensão e Queda de Ricardo Salgado".

Pelas origens familiares, pela posição que ocupava há mais de vinte anos,Ricardo Salgado é dos homens mais influentes da história do país. Próximo de quem governa, essencial para quem investe o homem que agora perdeu o controlo do banco que ajudou a refundar após a sua reprivatização, nunca esteve longe das decisões. Agora contados em livro por Maria João Babo e Maria João Gago, jornalistas do Jornal de Negócios, o percurso e os seus bastidores confundem-se com a história do próprio país.

A influência de Salgado pode ser vista pelas idas às reuniões do grupo Bilderberg, em 1997 e 1999, a convite de Francisco Pinto Balsemão, o único representante português no grupo onde se encontram os mais influentes líderes mundiais, um grupo onde não faltam velhos amigos da família Espírito Santo. Mas as relações com Balsemão haveriam de azedar, segundo as autoras ainda durante a década de 90. Mas no Bilderberg, Salgado nunca passou de convidado, nunca teve direito a discursar, um peso bem diferente do exercido na política nacional.

Se no livro é António Mexia, administrador do BES Investimento entre 90 e 98 , a quem é "atribuída a paternidade das parcerias público-privadas", Ricardo Salgado é visto como um dos seus principais impulsionadores, defensor assumido dos grandes investimentos do Estado, incluindo o comboio de alta velocidade e novo aeroporto de Lisboa, para o qual o BES chegou a integrar um consórcio em 2008 para um concurso público que nunca chegou a realizar-se.

"Dono disto tudo"

"Conhecido nos meios financeiros lisboetas por DDT, abreviatura de Dono Disto Tudo", lê-se no livro, Salgado começou por ter de modernizar o banco que tinha estado década e meia a ser gerido pelo estado e se ficava abaixo dos 10% da quota de mercado. Um problema de dimensão que Salgado resolveu e que só por uma vez esteve próximo de contar com um aliado - em Janeiro de 2000, foi anunciada uma fusão com o BPI que acabaria por colapsar por "divergências estratégicas". Descrito como "obcecado com as coisas práticas do banco, com os detalhes", ao ponto de nas sextas-feiras estar "ansioso para que chegue a segunda-feira" e de uma "inteligência única e uma capacidade de trabalho invulgar", descreve no livro "um dos seus maiores opositores nos últimos anos".

Os fins-de-semana são passados na casa que tem na Boca do Inferno, em Cascais, onde ao final do dia de Domingo invariavelmente acaba por reunir com amigos com quem mantém relações profissionais. Mas a regra, quanto aos tempos livres, é mesmo a descrição. "Entre o Natal e os Reis, passa pouco mais de uma semana na casa que tem no Brasil e que está localizada em Txai, na região da Baía, numa zona repleta de vegetação tropical e com vista para o Atlântico Sul", escrevem as autoras que apontam aos amigos Marcelo Rebelo de Sousa, Rita Amaral Cabral, Henrique Granadeiro e Graça Líbano Monteiro como os convidados mais regulares. Mesmo no Verão, Salgado não goza mais de dez dias de férias.

Com as polémicas em torno do BESe do GES a agitarem a política e mercados nacionais e internacionais, Ricardo Salgado despede-se da posição que ocupava desde 1991. Com ele vai "o último banqueiro" do país e assinala-se o fim do BES como o único banco ‘familiar'. O livro revela-se imprescindível para perceber os bastidores e o percurso de vida de um dos homens, e das famílias, mais poderosas e marcantes do país.

Da autoria de duas jornalistas, o Último Banqueiro conta os bastidores da “ascensão e queda de Ricardo Salgado”.

Diário Econômico

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