"O que puniram aqui hoje foi a coragem dos rapazes, a intenção. Ora a intenção não se pune em direito penal", insurgiu-se o advogado de defesa Miguel Francisco, depois de conhecido o acórdão do tribunal do Luanda e já com o mandado de detenção para cumprimento de pena, na cadeia, anunciado pelo juiz da causa, Januário Domingos.
Dos ativistas agora condenados, 15 já tinha estado em prisão preventiva entre 20 junho e 18 de dezembro (quando passaram a prisão domiciliária, até agora), enquanto outras duas jovens aguardavam em liberdade provisória.
Foram condenados a penas que variam entre os dois anos e três meses e os oito anos e seis meses de prisão efetiva, em cúmulo jurídico, essencialmente pela prática de crimes de atos preparatórios para uma rebelião e associação de malfeitores, numa alusão às reuniões semanais para discutir política que estes ativistas realizavam e que justificaram com o direito à liberdade de reunião e de associação.
"O tribunal, para condenar, terá de encontrar elementos objetivamente materiais. Não é com imaginações", frisou Miguel Francisco.
"Estupefactos, surpresos, indignados e inconformados com o acórdão", declarou o advogado Luís Nascimento, anunciando em nome de toda a defesa, ainda durante a audiência em que foi conhecida a condenação, o recurso para os tribunais Supremo e Constitucional.
Ainda assim, por implicar penas superiores a dois anos de prisão, a entrada destes recursos não implica a suspensão da aplicação efetiva da condenação, com todos os ativistas, responsáveis pela realização de várias manifestações de contestação ao regime desde 2011, a recolherem à prisão ainda esta segunda-feira.
"Eu imaginava, eu fui sempre preparando as pessoas que isso [condenação] haveria de acontecer, porque no desenrolar de todo o processo via-se qual era a tendência, era cortar uma geração de protestantes, era preciso impedir o protesto", disse o advogado de defesa David Mendes.
Questionado pela Lusa, o também dirigente da associação angolana de defesa dos direitos humanos "Mãos Livres" foi mais longe nas críticas ao tribunal: "Com essa medida, os outros jovens vão recuar e pensar duas vezes se devem ir às manifestações se não. Porque ninguém quer ficar dois ou oito anos na cadeia, então isso é uma medida punitiva coletiva, não é uma medida punitiva individualizada".
Para David Mendes, todo o julgamento foi "muito bem ensaiado", tendo em conta a alteração na acusação que foi feita na última sessão, deixando o Ministério Público cair o crime de atos preparatórios para um atentado ao Presidente angolano - o tribunal absolveu todos os réus deste crime -, acrescentando o de organização de malfeitores.
Com esta alteração, acusou, o tribunal aumentou a fasquia mínima de condenação (com moldura penal superior), levando a uma pena de prisão superior sem possibilidade de suspensão da execução da pena.
Para David Mendes, as "muitas inconstitucionalidades", a "fundamentação" e as "doutrinas ultrapassadas" em que diz assentar a decisão do tribunal justifica o recurso para as instâncias superiores.
"Só lamento que o Tribunal Supremo vai-se pronunciar daqui a dois anos, quando as pessoas já estarão há muito tempo na cadeia. Como o Tribunal Constitucional tem sido mais célere, vamos também fazer um recurso pelas inconstitucionalidades que detetamos", concluiu.
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