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Quinta, 14 Novembro 2024 22:22

Isto é uma revolução estúpida, mas não há povos amordaçados perpetuamente

Se alguém precisava de mais uma prova, aí está. Há homens eternamente estúpidos, mas não há povos perpetuamente amordaçados. Quando o tempo chega, a corda rebenta até para o lado pretensamente mais forte. É sempre assim. É incontornável. Mesmo nos regimes mais autoritários, haverá sempre o primeiro dia de todos os outros em que a história começará a ser reescrita. 

Por Evaristo Mulaza

É o que se passa no irmão do Índico. A Frelimo e Moçambique até podem estar ainda sob o controlo do mais inepto líder da sua história. Mas hoje, no meio do caos e da indefinição, sobra uma certeza. A história pós-colonial de Moçambique doravante será dividida necessariamente entre o antes e o depois de Venâncio Mondlane.

O candidato do PODEMOS até prefere reduzir-se a alguma insignificância. Pelas suas próprias palavras, Mondlane não se julga um ser “especial”. Vê-se apenas como o altifalante de que o povo precisava para soltar o derradeiro grito, farto dos pés à cabeça de um regime neocolonial, repressor, insensível, profundamente corrupto e inapelavelmente criminoso.

A verdade é que os factos não o desmentem. O povo sofrido de Moçambique não precisou mais do que de palavras de ordem, espalhadas por via das redes sociais, para embarcar numa viagem destemida de derrube do regime. Desde que se viu obrigado a esconder-se dos assassinos a soldo, Mondlane só tem precisado de uns directos nas redes sociais e de pouco mais.

O povo responde-lhe à medida, reconhecendo-lhe a legitimidade ganha nas mesas de voto, mas que o regime tenta roubar-lhe a qualquer custo. A todo o custo. Incluindo à custa da vida de dezenas de moçambicanos já barbaramente assassinados, mas cujo sangue a FRELIMO pressente estar mais perto de pagar como nunca.

O salto para Angola faz-se num impulso. Desde logo, porque o regime angolano fez questão de apressar-se a oferecer à FRELIMO o que for necessário para manter- -se no poder. Há naturalmente vários argumentos que justificam a postura de João Lourenço e do MPLA. Antes de tudo, fica claro, mais uma vez, que o regime angolano não aprende nem com os próprios erros nem com os disparates dos outros. O que significa também que mantém a incapacidade crónica de ler os sinais dos tempos e de perceber que não há mãos que travem tempestades.

Todo esse indiscernimento se resume, logicamente, numa questão central. A disponibilidade incondicional do regime angolano de ajudar a FRELIMO é, no fundo, uma tentativa de proteger-se de algum efeito contágio. Mas talvez já seja demasiado tarde.

Aos angolanos foi colocado um sapo na boca em 2022 que ainda não terá ultrapassado a garganta. Em 2027, verificando-se o que se passou com os resultados eleitorais em Moçambique, é muito improvável que os angolanos voltem a cruzar os braços.

Mas Angola ainda tem saídas para evitar um cenário de caos total pós-eleitoral. A chave está nas mãos do MPLA que tem de começar por democratizar-se com eleições internas de múltiplas candidaturas com candidatos de verdade. E, mais importante do que isso, desamordaçar os órgãos eleitorais, incluindo os da justiça, permitindo a transparência do processo eleitoral. De outra forma, não dirão que nunca houve avisos. Ou exemplos. Valor Económico

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