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Terça, 27 Junho 2023 21:12

O kwanza burro deve começar a recuperar no futuro próximo

É incrível que o Governo de Angola é especialista em adoptar medidas na margem. Nunca pensamos em reformas quando a economia está mais bem preparada para recebê-las e para absorver os impactos negativos, pelo contrário, preferimos tempos de crise para implementá-las e deixar as coisas ainda pior.

Por Mateus Maquiadi

Quando você toma uma medida a ter efeitos de um dia para outro é porque você tem pressa e precisa muito que ela se efective. E se você precisa que a medida se efective com máxima urgência é porque tem problemas. É como alguém que te dá dinheiro por empréstimo para pagares quando poderes. Passam semanas, ele não te cobra, mas quando um dia estiver apertado vai cobrar e exigir-te o kumbo rápido, alegando que precisa do dinheiro e que você já teve tempo suficiente para pagar. Assim é o Governo que há mais de 2 meses não consegue pagar os salários da função pública atempadamente.

O MINFIN está tão apertado que já começou a aumentar as taxas dos títulos da dívida pública para atrair os bancos. A situação está tão apertada que, na semana passada, a Unidade de Gestão da Dívida (UGT) emitiu Bilhetes do Tesouro a 364 dias, com a taxas de juro de 19,25% (2 pp acima das OTs a 10 anos). Acredito que isso deve ter sido para cobrir despesas com os salários que atrasam de forma consistente. Tudo isso é só para ter uma ideia de que essa medida dos combustíveis nada tem a ver com a eficiência económica, é uma poupança forçada que as famílias têm de fazer para continuar a alimentar a máquina ineficiente do governo.

Mas, claro, o que nos disseram foi outra coisa. Disseram que essa medida geraria uma poupança que serviria para fazer investimentos na saúde, educação, no Kwenda e para reduzir o desemprego. Para piorar colocaram uma jovem bonita a fazer publicidade na imprensa pública sobre os benefícios da remoção dos subsídios aos combustíveis com vista a lavar a mente da maioria dos nossos irmãos cuja boa educação lhes foi recusada. No final do dia, nem eles, nem nós acreditamos que daí vem boa coisa, porque somos incapazes de resolver o problema da má despesa. Só para dar nota que os camaradas que tomaram essa medida não descontinuaram os cartões que usam para pagar os combustíveis financiados pelos impostos que nós pagamos. Enfim, não há empatia!

É incrível que o Governo de Angola é especialista em adoptar medidas na margem. Nunca pensamos em reformas quando a economia está mais bem preparada para recebê-las e para absorver os impactos negativos, pelo contrário, preferimos tempos de crise para implementá- -las e deixar as coisas ainda pior.

A nova dinâmica que temos da taxa de câmbio é complexa e assustadora, sobretudo para aqueles que não acompanharam de perto as depreciações ocorridas em 2018, 2019 e 2020. 2018 foi provavelmente o ano mais difícil para o kwanza, quando depreciou quase 65%. Em 2019 foram quase 45% e em 2020 foram 32%. Este ano já foram mais de 30% e o que nos assusta a todos é a velocidade a que o kwanza está a cair. Neste caso, o que se espera do kwanza no segundo semestre desde ano? O meu desafio com este artigo é responder a essa questão.

O que houve?...

No ano passado, o Kwanza apreciou face ao dólar (+10%) e ao euro (+17%). A economia cresceu no geral 3%, a inflação ao todo contraiu 13 pontos percentuais para quase 13,86% e o BNA levou muito crédito por isso, quando grande parte deveria ter sido dado a Sua Excelência o Presidente russo, Vladimir Putin, por ter invadido a Ucrânia. A política monetária do BNA pouco teve a ver com a redução da inflação, tendo em vista que a taxa BNA só serve para forward guidence.

Honestamente, cá em Angola estamos todos atirados à sorte. Penso que todo esse problema começou em Setembro de 2022, quando as importações começaram a crescer visivelmente muito mais do que as exportações em termos homólogos, enxugando recursos cambiais de forma gradual. No princípio do ano, a Total informou que o campo Dália, do bloco 17, um dos principais campos petrolíferos, iria parar a sua produção por 30 dias no mês de Março por questões de manutenção. Isso significaria contracção na produção com impacto nas exportações e, consequentemente, nos recursos cambiais, gerando pressão no mercado. Para piorar as coisas, o MINFIN, o tal maior fornecedor, tem os seus compromissos com a dívida e, entre Março a Abril, pagou uns bons milhões de dólares, tendo deixado o mercado cambial órfão por mais de um mês, como resultado o inocente Kwanza não resistiu. No final das contas, o Kwanza já tinha de começar a depreciar em Abril ou um pouco antes, mas apenas começou algures em Maio, porque o BNA impedia os bancos de praticar taxas de mercado, sendo curioso que nos últimos dois Comités de Política Monetária a frase mais repetida foi a de que "o mercado está a funcionar de acordo com as forças da procura e da oferta". Ou seja, nem o BNA consegue ser transparente. A quem confiarei, e quem irá por nós (Isaías 6:8)?

Não é possível ter mercado livre enquanto continuarmos com problemas estruturais, sejamos honestos. O BNA deveria ter deixado o Kwanza depreciar lentamente a partir de Janeiro, mas preferiu controlar e o coitado Kwanza está a pagar e as pessoas estão em pânico.

Penso que o Kwanza vai inverter a tendência de quebra nos próximos meses e começar a apreciar ligeiramente

Minha interpretação sobre o câmbio para os próximos 6 meses

Ponto 1: os ánimos precisam ficar mais calmos. Penso que o Kwanza vai inverter a tendência de quebra nos próximos meses e começar a apreciar ligeiramente, corrigindo parte da perda que tem tido. A produção petrolífera que caiu para mínimos históricos em torno dos 978 mil barris dia em março, cresceu 12% em Abril e mais 5% em Maio para 1,14 milhões de barris dia. Isso vai resultar em mais ganhos de exportação e deve aliviar as tensões no cambial nos próximos tempos. Angola ainda continua com restrições de capacidade, mas espero que a produção ronde em torno dos 1,1 milhões barris dia;

Ponto 2: do lado do preço o mercado de commodity está numa fase de sub oferta e países como a Arábia Saudita estão a forçar mais cortes para além dos já feitos. Com o núcleo de inflação dos EUA a contrair para 2,6%, tendo a Reserva Federal decidido não alterar o curso da política monetária no último FOMEC, é expectável que nos próximos já não venha a adoptar uma posição hawkish, porque a taxa de juros já está próxima do seu nivel terminal. Neste contexto, caso os receios do lado da procura diminuam mais ainda, o preço do barril de petróleo vai subire ficar bem acima dos 72-78 USD. Neste momento, não fosse as preocupações em relação à procura que ainda continuam a dominar o mercado petrolífero, os preços já estariam lá mais para cima. O que impede a subida dos preços é o facto de a procura da China não ter ainda recuperado totalmente e também ainda permanecem riscos de recessão;

Ponto 3: as reservas internacionais caíram em quase 900 milhões USD, em parte porque o BNA recentemente vendeu divisas no mercado, mas uma taxa bem acima dos 500 por dólar, que é alta. A minha humilde interpretação é que, apesar de estar na luta para preservar a moeda nacional, o BNA não quero Kwanza burro tão lá em cima e nem tão lá em baixo e também acho que o câmbio está a fazer um over shooting. O BNA está a permitir esse movimento, provavelmente porque manter a taxa de câmbio um pouco acima dos 600 por algum tempo permite reduzir as importações e aumentar as exportações, gerando um pouso mais suave da taxa de câmbio que flutua desordenadamente. E fácil perceber isso pelo gráfico.

Contas simples com base nos dados que colectei, a taxa de câmbio tem tido uma correlação positiva com as exportações e negativa com as importações. Sei que não temos grande produção interna para tudo isso ser uma verdade absoluta, mas ainda assim serve para compensar ou aliviara pressão do kwanza. Neste caso penso que o BNA deveria considerar 700 por dólar como taxa terminal.

Assim sendo, o nosso kwanza vai corrigir parte do movimento de depreciação nos próximos seis meses, mas deve terminar com perdas year to day. Enfim, já vimos de tudo em Angola, o Kwanza é inocente, vai recuperar um pouco e depois perder-se mais algures no futuro. Expansão

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