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Domingo, 21 Mai 2023 22:55

Diplomacia Parlamentar: deputados angolanos e sua falta de preparação nas questões de política externa

Todo deputado é um político mas nem todo político é um deputado, sendo estes representantes do povo, devem estar a par e passo dos fenómenos políticos internos e das dinâmicas globais, sobretudo, questões relacionadas ao andamento da economia internacional, segurança regional e internacionais e das movimentações estratégicas movidas pelos Estados, na busca pelo poder, hegemonia e alianças que podem condicionar a estabilidade e o equilíbrio do sistema internacional.

Para «Weisglas e De Boer» a diplomacia parlamentar está relacionada com as  actividades internacionais efectuadas pelos parlamentares nacionais delineando o entendimento mútuo entre países a assistência às autoridades parlamentares estrangeiras em questões de controle governamental e a representação do povo nos ambientes externos. Portanto, a necessidade pela diplomacia parlamentar manifesta-se como outra vertente de diplomacia capaz de estabelecer relações entre as Nações aspirando aos mais sortidos objectivos.

Por sua vez o pesquisador Leonardo Quarenta define a diplomacia parlamentar como um conjunto de parâmetros, mecanismos e estratégicas diplomáticas, que visam a cooperação entre os Parlamentos nacionais, com finalidade de traçar programas e projectos conjunturais amplos de interesse recíproco, em todos os sectores e dimensões, tais comos: dimensões legislativas, judiciárias, econômicas, humanitárias público-sociais e cooperação ao desenvolvimento.

Na diplomacia parlamentar os deputados desempenham dupla função: a de diplomata (político) e de legislador. Portanto, as delegações parlamentares de cada País nas suas viagens oficiais de Estado, devem ter consigo uma agenda e programa concreto alinhada com os interesses nacionais, de modo a se defender o Estado dentro das estratégias traçadas pelo Governo. Não deve haver em momento nenhum contradições entre aquilo que diz o Governo e aquilo que diz a delegação parlamentar ao estarem no exterior com parlamentares de outros Estados em busca de acordos e cooperação.

Em Angola há muito trabalho a ser feito a nível Parlamentar, nossos deputados (na sua maioria) além de apresentarem falta de domínio constitucional (conhecimentos jurídicos) e político, não dominam matérias de política externa, os poucos que ali estão formados em Direito internacional e Relações internacionais carecem de especializações e de aprofundamento científico nestas mesmas áreas.

Nossos deputados entendem pouco sobre diplomacia, especificamente: diplomacia econômica, diplomacia comercial, diplomacia cultural, diplomacia jurídica, diplomacia judiciária, diplomacia governamental, diplomacia empresarial, para não citarmos aqui a diplomacia militar e diplomacia de defesa, que são diplomacias de extrema importância, tendo em conta a segurança do Estado e a actual presença e complexidade do terrorismo internacional e transnacional.

Toda esta questão acima referida é fundamental um deputado ter em conta, na diplomacia parlamantar tudo isto é discutido, analisado, decidido e executado estrategicamente, mas como se irá fazer isto se os deputados que temos muitos deles sequer têm noção da relevância disto? Se o nosso Parlamento pouco valoriza a cooperação inter-Parlamentar com os outros Estados?

Não há estratégias em Angola em termos de diplomacia parlamentar, nunca houve, e tenho certeza absoluta que esta é a primeira vez que muitos estão ouvindo falar de diplomacia parlamentar. De regra geral, quase todos sabem e ouvem dizer sobre Diplomacia Econômica, Diplomacia Militar e Diplomacia Cultural, outros tipos de Diplomacia poucos têm domínio e conhecimento, mesmo aqueles que se formam em Relações Internacionais e Direito Internacional, na sua maioria não têm noção disso porque isso não se estuda nas Universidades, não importa se estás em África ou na Europa, as Universidades de regra geral não ensinam isso. Essas formações: diplomacia parlamentar, diplomacia judiciária, diplomacia jurídica, diplomacia científica, diplomacia corporativa, mesmo a própria diplomacia econômica, são formações que normalmente fazem-se nas Academias (academias políticas e diplomáticas), nas organizações e centros formativos específicos de Pós-graduações e de Mestrados profissionais, é aqui onde se aprende na prática sobre tudo isso, portanto, a maioria não tem conhecimento sobre isso, mas é preciso ir atrás, ir atrás para se aprender e ter domínio, não de forma superficial mas de forma profunda.

Um Parlamento (Assembleia, Congresso) é um órgão de soberania Nacional que defende prevalentemente os interesses dos cidadãos, mas defender os cidadãos envolve o empenho de outros sectores, departamentos e instituições do Estado, portanto, é dever do deputado entender os factos sociais no seu todo, mas para se entender é necessário competência, qualificação, espírito lógico e crítico, para depois poder se discutir sobre tais factos sociais e apresentar depois propostas e soluções.

O que acontece no Parlamento angolano é algo surreal, muitas das vezes nota-se que as bancadas parlamentares perdem mais tempo em acusar um ao outro do que discutir realmente questões sobre o País. Uma vez dessas pus-me a aconmpanhar uma das sessões parlamentares, era visível ouvir vários insultos e ofensas entre as partes. Como cidadão angolano que sou, fiquei triste ver aquilo, como político que sou, notei claramente falta de ideias por parte dos nossos parlamentares (repetem sempre as mesmas coisas), como constitucionalista que sou, sessões daquele tipo não dá pra levar à sério, como diplomático que sou, cheguei a conclusão, que a falta de diálogo sereno e equilibrado entre as bancadas parlamentares está longe de ser salutar porque todos limitam-se a proferir palavras ofensivas um ao outro e todos querem ter razão.

Em política não existe isso de ter razão (eu tenho razão e tu estás errado, isso não existe em política e nunca existirá porque a natureza política não permite isto), em política «nunca niguém tem razão», não importa se é você que governa ou se você é da oposição, todos têm responsabilidades e obrigações para com o povo e para com o Estado, a culpa de um directa ou indirectamente também é culpa do outro, em política quem governa só faz o que faz em base o tipo de opositor que tem, assim funciona no realismo político, os adversários uma vez que conhecem-se, passam a saber as capacidades um do outro (capacidade não é só poder político ou econômico, é também estratégias, o modo como as partes movimentam-se no tabuleiro político, geopolítico, tráfico de influência, etc), em base a tudo isso dentro do «status quo» quem governa fará as coisas tendo em conta o seu oponente ou o tipo de adversário que tem. Se quem governa agir mal a responsabilidade não será apenas dele e da sua staff, será também do seu opositor (sei que muitos não estão a endenter isso), mas assim funciona em política, política pura, realismo político… é tipo no futebol, se ganhamos, ganhamos todos, se perdemos, perdemos todos, não importa quem errou ou quem falhou o penalti, não importa qual foi o defesa que deixou Messi passar e marcar, se a bola entrou (vitória ou derrota) toda a equipa deve assumir a responsabilidade, então, ou todos perdem ou todos ganham (não há meio termo), assim também funciona dentro da Administração do Estado, se o País é apenas um, então, ninguém está insento da culpa ou da responsabilidade, apontar dedo um ao outro é perca de tempo, os partidos juntos, devem pensar em estratégias, estratégias de tipo econômico, de desenvolvimento social, estratégias sobre formação do Homem, segurança Nacional, tecnologia, etc.

Dentro do Parlamento angolano não temos por exemplo Comissão Parlamentar relacionada à Espionagem e Segurança do Estado; Comissão Parlamentar sobre as Forças Armadas (Cooperação Estratégico-Militar); Comissão Parlamentar sobre a Cooperação Académica e Científica; Comissão Parlamentar para Cultura, Intercâmbio e Imigração (se tiver que alguém me corrija, a prudência intelectual, política e diplomática, me permite ouvir e aprender com todos sem excepção). Essas Comissões, assim como tantas outras em falta, são Comissões fundamentais, tudo isso faz parte da dinâmica da diplomacia parlamentar.

Portanto, recomendo a prática da Diplomacia Parlamentar por parte dos nossos deputados, sobre isto, se tivesse que atribuir uma nota de 0 a 20, daria 3/20 ao Parlamento angolano porque em Angola não se pratica diplomacia parlamentar, assim como não se pratica tantas outras tipologias diplomáticas, que na prática são desconhecidas por 90% da população (universitários e não universitáios, poucos têm conhecimento disso), portanto, apelo à Academia Diplomática Venâncio de Moura (MIREX) que criem cursos sobre diplomacia parlamentar a favor dos nossos deputados e outros cursos no âmbito diplomático em prol dos sectores e das instituições do País, lembrando que a diplomacia está ligada e presente em tudo, pessoalmente, posso ajudar na elabroração dos programas formativos diplomáticos, ao mesmo tempo ensinar e explicar seus procedimentos no âmbito da cooperação parlamentar e não só. 

Deputados devem diferenciar-se de influenciadores digitais (em base à realidade angolana), muitos dos nossos deputados funcionam mais como influenciadores digitais do que propriamente como deputados, perdem muito tempo nas redes sociais falando de coisas pouco relacionadas à sua função. Um deputado enquanto deputado não representa partidos políticos mas sim o povo, muitos falam em nome do povo (aproveitamento político) mas na prática estão aí por interesses próprios e partidários (é a política).

Nessa actual legislatura (2022-2027) muitos assim que tomaram posse no Parlamento deixaram de atender chamadas e responder mensagens dos seus próprios amigos, tornaram-se arrogantes e insensíveis, estão dizendo que é preciso marcar audiência, então, se ele é teu amigo, cresceram juntos, passeavam juntos, bebiam juntos, agora ele tem que marcar audiência? … A irracionalidade é algo perigoso e fatal!

Contudo, a Assembleia Nacional de Angola precisa ser mais exigente com os seus próprios parlamentares, além do apelo feito à Academia Venâncio de Moura, os partidos políticos também devem reforçar a formação dos seus próprios militantes a nível interno, é visível a falta de preparação de alto nível, poucos se têm saído bem no Parlmento angolano, os discursos das bancadas parlamentares são quase sempre os mesmos, não há muita novidade, são réplicas e versões, portanto, não há estratégias, sobre isto não dúvidas nenhuma. A diplomacia parlamentar é necessária, não é uma opção nem coisa relativa, é necessária, tal igual o político comum, o deputado também é um funcionário público e todos eles têm obrigações de Estado, cada um deve fazer bem o seu trabalho dentro da Administração do Estado.

N.B: Próximo artigo será sobre Diplomacia Judiciária (Magistratura), mas antes irei fazer sair mais um artigo sobre “Defesa e Segurança”, depois publicarei sobre a Magistratura...

Diplomacia Parlamentar

Diplomacia Jurídica

Diplomacia Judiciária

Diplomacia Econômica

Diplomacia Comercial

Diplomacia Empresarial

Diplomacia Militar

Diplomacia de Defesa

Diplomacia Pública

Diplomacia Científica

Diplomacia Cultural

Diplomacia Presidencial

Competências Internacionais

Por: Leonardo Quarenta 

Ph.D em Direito Constitucional e Internacional

Mestrado em Relações Internacionais: Diplomacia, Mediação e Gestão de Crises

Formação em Conselheiro Civil e Militar

Formação em Geopolítica de África: O Papel da CPLP na Segurança Regional

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