O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, criticou o premiê britânico, David Cameron, e o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy acusando-os de omissão durante a crise da Líbia, que resultou na queda de Muammar Kadafi, em 2011. As declarações foram publicadas na edição desta semana da revista The Atlantic.
"Quando eu volto ao passado e eu me pergunto o que deu errado, há espaço para a crítica, porque eu tinha mais fé de que os europeus, diante da proximidade com a Líbia, estariam envolvidos na continuidade [da missão], disse. Essa foi a primeira vez que um líder norte-americano criticou abertamente seus aliados pelo problema.
Para Obama, crise na Líbia foi um "show de merdas"
De forma privativa, conta a revista, Obama classifica a atual situação do país como um "show de merdas". Segundo o presidente, Cameron "se distraiu com uma variedade de outras coisas" e que Sarkozy, que o presidente norte-americano lembrou que perdeu o emprego no ano seguinte, estava mais preocupado em "chamar a atenção para os voos que enviava à campanha aérea, apesar do fato de que nós tínhamos eliminado todas as defesas aéreas e essencialmente montado toda a infraestrutura" para a intervenção.
“Agora, a opção um seria não fazer nada, e havia alguns no governo que disseram, que, por mais trágica que a situação líbia fosse, não era nosso problema. Na minha maneira de ver, isso seria nosso problema se, de fato, caos completo e guerra civil emergissem na Líbia. Mas isso não está no cerne dos interesses dos EUA – de que faz sentido para nós atacar o regime de Kadafi unilateralmente. Naquele ponto, você tinha a Europa e uma série de países do Golfo que desprezavam Kadafi, ou estavam preocupadas no sentido humanitário, que pediam por ação. Mas o que foi um hábito nas últimas décadas nessas circunstâncias são as pessoas nos pressionando para agir, mas mostrando falta de vontade de investir nisso”, afirmou.
Obama também culpou o que a revista chama de “dinâmicas internas líbias. “O grau de divisão tribal na Líbia era maior que os nossos analistas esperavam. E nossa capacidade para ter qualquer tipo de estrutura com a qual pudéssemos interagir e começar a treinar e prover recursos se desmontou muito rapidamente”, disse. Usar “tribos” para determinar as populações africanas é um termo considerado equivocado por especialistas no continente.
Os franceses evitaram fazer comentários sobre a entrevista e o governo britânico minimizou o impacto das declarações, dizendo que "continua trabalhando duro com nossos parceiros internacionais para apoiar um processo na Líbia que coloque no poder um governo capaz de levar estabilidade para aquele país".
Crise na Líbia
A crise na Líbia começou em 2011 após uma convulsão social e a morte do então presidente Muammar Kadafi. Os dois fatos levaram a nação ao caos total por não ter um poder que conseguisse unir o país. Um ano após a queda do governo, e em pleno processo de reconstrução após as bombas jogadas na Líbia pela coalizão internacional, ocorrem as primeiras eleições livres que pareciam levar os líbios a uma verdadeira democracia.
Mas, os confrontos ainda remanescentes e a violência entre várias milícias e os ex-combatentes que não haviam abandonado as armas complicaram a situação cada vez mais. No verão de 2014, o país entrou em colapso total com a divisão entre as instituições políticas - Tobruk e Trípoli - e a guerra entre as milícias Zintan e Misurata pelo controle da capital. O novo Parlamento, junto ao governo do primeiro-ministro Abdullah al-Thani, que era reconhecido pelo mundo como oficial, são obrigados a fugir e a refugiar-se na cidade de Tobruk, em Cirenaica.
No mesmo período, a capital cai sob o controle do grupo jihadista Fajr Libya, que resolveu comandar o país em oposição ao governo de Tobruk e em aliança com a Irmandade Muçulmana. O resultado desse caos é de uma nação dividida ao meio. Para completar, a área de Sirte - ao norte - caiu nas mãos dos terroristas do Estado Islâmico, onde houve a imposição de um tipo de emirado baseado na rígida interpretação da sharia (lei islâmica).
Desde o fim do ano passado, após um acordo de paz política mediado pelas Nações Unidas, os Parlamentos de Tobruk e Trípoli tentam criar um governo único. Porém, ainda não houve um acordo para a retomada do processo político.
(*) Com Ansa