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Terça, 02 Março 2021 09:55

Estado perde 800 milhões dólares com as três fábricas têxteis

Depois de ter investido 1,2 mil milhões USD na reabilitação da África Têxtil, da Comandante Bula e da Textang II, o Estado recuperará no máximo 425 milhões USD. Isto caso as empresas que venceram o concurso para a sua gestão exerçam as respectivas opções de compra.

O Estado angolano deverá perder cerca de 800 milhões USD com as três fábricas têxteis reabilitadas com um empréstimo japonês, caso os vencedores do concurso para a sua exploração exerçam a opção de compra, de acordo com cálculos do mercado a partir da informação pública disponível.

Em causa estão as fábricas África Têxtil, localizada em Benguela, reinaugurada no passado fim de semana pelo Presidente da República, João Lourenço, Comandante Bula, ex-SATEC, no Cuanza-Norte e Textang II, em Luanda, onde o Estado investiu cerca de 1,2 mil milhões USD.

Caso as empresas gestoras das unidades fabris decidam comprar as fábricas, o Estado poderá encaixar 268 mil milhões Kz com a alienação das três unidades. Considerando a taxa de câmbio de 630,95 kz por cada USD desta quinta-feira, 25 de Fevereiro, o contravalor em dólares ascende a 425 milhões USD.

Feitas as contas, do investimento estimado em 1,2 mil milhões USD, o Estado angolano recuperará pouco mais de 400 milhões USD, ou seja perderá cerca de 800 milhões USD.

A venda das três fábricas têxteis enquadra-se no Programa de Privatizações (PROPRIV) 2018- 2022.

A empresa zimbabweana, BAOBAB Cotton Group venceu o concurso para a gestão das fábricas África Têxtil, localizada em Benguela e Comandante Bula, ex-SATEC, no Cuanza-Norte, por um período de 15 anos em ambos os casos, enquanto a empresa angolana IEP ficou com a gestão da Textang II por oito anos.

Relativamente à África Têxtil, o BAOBAB Cotton Group pagará um valor anual fixo é de cerca de 268 milhões Kz, por um período 15 anos, e uma renda variável equivalente a 5% das receitas anuais. A partir do 10.º ano de contrato poderá exercer uma opção de compra por 104 mil milhões Kz, descontados os valores pagos até ao momento do exercício da opção de compra.

Pela Comandante Bula, ex-SATEC, os zimbabueanos pagarão um valor anual fixo de cerca de 311 milhões Kz durante 15 anos e uma renda variável anual equivalente a 5% das vendas. Também poderão comprar a unidade a partir do 10.º ano de contrato por 104 mil milhões Kz, descontados os valores pagos até ao momento do exercício da opção de compra.

Na Textang II, adjudicada à empresa angolana IEP, a componente fixa anual do contrato é de 875 milhões Kz, a serem pagos durante os oito anos de contrato e renda anual foi estabelecida em 6% das vendas. No final dos oitos anos, a IEP poderá comprar a Textang II por 59 mil milhões Kz, podendo descontar os valores pagos até ao momento do exercício da opção de compra.

O Mercado contactou o IGAPE para saber se o preço de venda das fábricas está indexado ao dólar, mas o instituto não respondeu até ao fecho da desta edição.

“Espera-se que as empresas que irão gerir estas fábricas consigam rentabilizar o investimento efectuado pelo Estado, e que consigam, efectivamente, fornecer os tecidos ao mercado emergente de fábricas de confecção têxteis nacionais”, explica o empresário têxtil Ricardo Vaz em declarações ao Mercado.

“Penso que são estruturas muito grandes e que necessitam de uma gestão muito rigorosa para serem rentabilizadas”, alertou.

O também administrador da fábrica têxtil de Confecções Marave, situada no Complexo Industrial da Comarca, em Viana, aponta a falta de crédito bancário e a concorrência de produtos acabados de outros países, como as principais dificuldades.

“Para melhorar a indústria têxtil o Governo deveria integrar os artigos têxteis na lista de produtos PRODESI para permitir acesso a financiamentos bonificados, aumentar provisoriamente os direitos de importação sobre os produtos acabados, no sentido de nivelar a concorrência com os países produtores de baixo custo, e reservar as aquisições dos vários organismos governamentais (Forças de Segurança; Saúde; Educação) à Produção Nacional”, precisou.

Recuperação das fábricas

Em Junho de 2019, a Procuradoria Geral da República (PGR) revelou em comunicado de imprensa, que o Serviço Nacional de Recuperação de Activos da PGR concluíra que várias empresas privadas beneficiaram de financiamento de fundos públicos, “algumas em processo de privatização irregular e outras financiadas e suportadas com garantia soberana do Estado”.

Outras dessas empresas, segundo ainda o comunicado, foram financiadas e suportadas com garantia soberana do Estado sem ter havido o reembolso voluntário desses fundos públicos, naquela data. Entre as empresas, constavam as fábricas de tecidos Mahinajethu-Satec, a Alassola-África Têxtil, Nova Textang II.

De acordo com a PGR, as fábricas têxteis foram financiadas através de uma linha de crédito do Japan Bank for Internacional Cooperation, com cerca de mil milhões USD. Empréstimos que foram cobrados ao Estado. De igual modo, foi ainda concedida pelo Banco BAI uma linha de crédito à fábrica do Cuanza-Norte, e à têxtil de Benguela (AlassolaÁfrica Têxtil).

Em relação a esse último empréstimo, o Estado prestou uma garantia soberana no valor total de 13 mil milhões Kz. Segundo o comunicado, as empresas nunca devolveram o empréstimo, que está a ser cobrado ao Estado, enquanto garante, tendo inclusive já sido descontada uma prestação.

Alassola acusa Comissão de Avaliação

A antiga gestora da fábrica África Textil, Alassola, empresa de direito angolano acusou a Comissão de Avaliação do concurso público internacional para a privatização das unidades industriais têxteis, integradas no Programa de Privatizações, de ter procedido de modo “inválido, ilegal e inconstitucional” ao processo que ditou a sua exclusão da fase preliminar do concurso.

Questionada pelo Mercado sobre a razão de não estar qualificada para o concurso, a empresa respondeu que a decisão coube à comissão de avaliação.

“Com efeito, na componente corporativa (experiência e perfil geral da empresa, experiência comprovada da equipa de gestão da empresa, histórico de endividamento da empresa nos últimos três anos) a Alassola teve uma pontuação de 0, ao contrário da Cosal, que é uma empresa conhecida por se dedicar ao ramo do comércio automóvel”, explica.

Ao ter conhecimento da sua pontuação a empresa solicitou à comissão de avaliação um esclarecimento, tendo esta respondido que tal se devia ao facto de a Alassola ter sido parte no arresto da fábrica.

“Ora, não concordando com tal decisão foi interposto recurso hierárquico para o ministro das Finanças que até hoje nunca deu resposta ao recurso”, expressa.

“Uma das obrigações constantes do caderno de encargos do concurso era o pagamento do “down paiment” de 15% do valor do financiamento contraído pelo Estado angolano junto do banco Japonês, tendo a Alassola cumprido com essa obrigação através de um financiamento contraído em Setembro de 2013, junto do banco BAI, no valor de 6,6 mil milhões Kz”, argumenta a empresa.

A instituição assinou o contrato de gestão da África Têxtil com Ministério da Indústria, em 2012 e no ano seguinte o órgão ministerial fez a entrega formal da unidade fabril.

“A Alassola assumiu o destino da fábrica e acompanhou todo o processo de reabilitação, suportando custos inerentes, nomeadamente aduaneiros, formação e contratação de pessoal, contratação de prestadores de serviços, orçados em milhões dólares”.

Segundo a gestora, a reabilitação da fábrica foi formalmente concluída pela empresa japonesa Marubeni em 2015 e a fábrica começou a operar no dia 30 de Novembro de 2016.

No início do período de produção produziu para exportação cerca de 650 toneladas de fio (produto intermédio); produziu toalhas, batas escolares, uniformes para hospitais e hotéis, máscaras faciais e teve cerca de 159 trabalhadores. MERCADO

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