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Terça, 19 Janeiro 2016 16:48

Campanha à reeleição de Lula em 2006 recebeu U$D 23 milhões da Sonangol

A campanha de Lula à reeleição de 2006 teria contado com até cerca de U$D 23 milhões de propina proveniente da compra de US$ 300 milhões blocos de exploração petróleo na África, de acordo com o ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró.

As informações de Cerveró, que já dirigiu a área Internacional da estatal, foram dadas a investigadores da Operação Lava Jato durante negociações para fechar seu acordo de delação premiada e foram reveladas pelo jornal "Valor Econômico".

As declarações sobre a propina são citadas em anexo de informações elaborado por advogados de Cerveró. Lá, ele afirma que soube do repasse por meio de Manuel Domingos Vicente, ex-presidente do conselho de administração da estatal petrolífera de Angola, a Sonangol, e hoje é vice-presidente do país.

"Manoel Vicente foi explícito em afirmar que US$ 300 milhões pagos pela Petrobras a Sonangol, companhia estatal de petróleo de Angola, retornaram ao Brasil como propina para financiamento de campanha presidencial do PT valores entre R$ 40 e R$ 50 milhões."

O ex-director internacional da Petrobras disse aos investigadores que "a referida negociação foi conduzida pelos altos escalões dos Governos brasileiro e angolano, sendo o representante brasileiro o ministro da Fazenda [Antonio] Palocci”, que já negou a sua participação no assunto

Aquele acusado de ser um dos principais agentes da operação Lava Jato e que que se encontra detido, ressaltou ainda no documento que, "em 2005, houve uma oferta internacional de Angola, de venda de blocos de exploração em águas profundas, como se fosse um grande leilão”.

O documento entregue pela defesa de Cerveró à Procuradoria Geral da República diz ainda que "Nestor tinha uma relação de amizade com o Dr. Manoel [sic] Vicente [presidente da Sonangol], que em conversas mencionou textualmente a frase: ‘Porque nós somos homens do partido! Temos que atender as determinações do Partido!”.

A revista Valor Económico disse não ter conseguido falar nem com o Instituto Lula nem com vice-presidente angola Manuel Vicente.

Finalmente aconteceu: a ladroagem na política – o desvio de dinheiro público ou, ainda, em termos menos polidos, a roubalheira nacional – chegou ao topo de popularidade. Não se fala de outra coisa. No final do ano passado, numa pesquisa do Instituto Datafolha, a corrupção apareceu em primeiro lugar na lista das maiores preocupações dos brasileiros, com nada menos que 34% das respostas. Em segundo lugar veio a saúde, com 16%, e, em terceiro, o desemprego, com 10%. Educação e segurança ficaram empatadas em quarto lugar, com 8%. É um resultado consagrador – e inédito. Pela primeira vez, numa pesquisa que vem sendo feita no Brasil desde 1990, a gatunagem das autoridades sem decoro assume a liderança.

No Fantástico, da Rede Globo, o “Repórter secreto” foi um dos quadros de maior sucesso de 2015. Numa série de reportagens investigativas em 23 cidades diferentes, o jornalista Eduardo Faustini identificou desvios que, somados, alcançam a casa de R$ 1 bilhão. O mote do “Repórter secreto” virou um bordão do povo: “Cadê o dinheiro que tava aqui?”. Também em 2015, o Ministério Público lançou a campanha “Diga não à corrupção” e, em dezembro, um grupo de procuradores e juristas criou o Instituto “Não Aceito Corrupção”. Ao que tudo indica, se depender da vontade da nação, chegou a hora de acabar com a lambança.

Claro que isso é uma ótima notícia. É necessário e urgente investigar, julgar e punir os corruptos e os corruptores. Não poderíamos ter um espírito mais motivador para começar o ano de 2016. Por isso mesmo, é uma boa hora para perguntar: a corrupção generalizada é a causa maior das mazelas do Brasil? Ou será que, além de ser um fator de deterioração da máquina pública, ela também não é um efeito, um sintoma de desacertos mais profundos e mais persistentes?

Se você examinar com atenção, vai concluir que sim: embora seja causa de estragos devastadores (devendo, portanto, ser enfrentada com todas as armas lícitas possíveis), a prática de afanar o Erário é também sintoma de uma doença pior: a persistência de marcos legais anacrônicos no Estado brasileiro, que sabotam a transparência, a agilidade, a eficiência, a impessoalidade, a livre concorrência e a própria democracia. A corrupção campeia onde o poder público está defasado, acomodado, entregue às preferências pessoais de oligarquias velhas e aproveitadores novos. Ladrões de dinheiro público só proliferam em ambientes escuros, opacos, fora do alcance da vista da nação. Os bandoleiros engravatados se multiplicam nos porões secretos de edifícios que deveriam ser públicos – e não são.

O atraso campeia junto. Pedaços do Estado avessos à fiscalização da sociedade, além de engordarem o bolso dos gatunos, são também  pesados, lentos, inamistosos e, mais grave do que tudo isso, produzem injustiça social, desperdício e pobreza. No nosso caso, ladroagem e ineficiência administrativa são sócias.

Se perdermos de vista que a roubalheira, além de causa do atraso, também é um sintoma do mesmo atraso, perderemos a perspectiva política dessa grande tragédia brasileira. Sem essa perspectiva, o discurso contra a corrupção acaba resvalando para um discurso de pura histeria moralista, que pode variar o alvo conforme varia o gosto do freguês. Na boca de alguns, o discurso moralista se volta contra todos os políticos; para outros, os vilões petistas, e, no linguajar dos populistas, a culpa é dos endinheirados. Fiquemos atentos, porque o discurso do ódio não constrói nada de bom.

O problema não está nas pessoas – ou nesse ou naquele tipo de pessoa. O político brasileiro, considerado individualmente, não é mais ou menos espertalhão do que o político angolano ou o político japonês, embora os níveis de corrupção no Brasil, em Angola e no Japão sejam drasticamente distintos. O ser humano é igual em todos os continentes, mas, em alguns lugares, embolsar o dinheiro dos impostos pode ser um bom negócio. O Brasil não pode mais ser um lugar desse tipo.

O desafio, enfim, não é mudar pessoas, mas mudar o lugar, as regras do lugar, o ambiente político. A partir daí, virão mudanças culturais e estas, por fim, trarão as mudanças de hábito e de comportamento. O ser humano continuará igual, mas a sociedade e o país serão melhores.

No mais, é muito animador que corruptos e corruptores tenham se convertido nos vilões preferenciais dos brasileiros. Apenas cuidemos de evitar o discurso do ódio – que também é sintoma e causa de atraso. O combate à corrupção não deve ser visto exatamente como uma guerra, mas como um ato de razão e de bom-senso.

 

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