Rafael Marques argumenta, nesta ação a que a Lusa teve acesso, que a nomeação e tomada de posse de Carlos Cavuquila violam princípios constitucionais e o Estatuto dos Magistrados Judiciais.
Carlos Cavuquila, condenado pelo Tribunal de Contas (TdC) angolano a devolver 29 milhões de kwanzas (cerca de 32.500 euros) ao Estado angolano, num processo cuja execução se encontra pendente no Tribunal Provincial de Luanda, foi designado em 16 de junho passado pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) para a de vaga de juiz conselheiro do TS.
Corre igualmente trâmites na 2.ª Câmara do TdC um outro processo que responsabiliza Carlos Cavuquila, empossado no cargo pelo Presidente angolano, João Lourenço, em 19 de junho passado, pelo desvio de 1,519 mil milhões de kwanzas (1,6 milhões de euros), indicando que o arguido deve devolver as verbas ao Estado e enfrentar processos sancionatórios, como recorda Rafael Marques.
O jornalista, diretor do site Maka Angola, sublinha que o Estatuto dos Magistrados Judiciais é claro quando determina que é requisito para o ingresso à Magistratura Judicial a “idoneidade moral e cívica”, referindo que diante dos factos Carlos Cavuquila “não passa no teste de idoneidade cívica e moral”.
“Não se diga que Carlos Cavuquila não foi condenado por nenhum tribunal criminal e que só nesse caso estaria impedido de assumir funções. Não é isso que o Estatuto dos Magistrados Judiciais determina. A exclusão determinada pelo estatuto é mais ampla”, refere-se na ação popular, em que é representado pelo advogado José Luís Domingos.
Segundo o documento, o magistrado “condenado por usar mal os fundos públicos descredibiliza a magistratura, num tempo em que o combate à corrupção foi erguido a política de Estado, e bem”.
O CSMJ “violou a lei ao nomear alguém que não tem a idoneidade moral e cívica exigida pelo artigo 40.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais. Teria sido pré-requisito da designação do conselho aferir este item”, realça Rafael Marques.
O Presidente da República, observa o ativista angolano, além de deter o poder discricionário de nomear ou não nomear a pessoa indicada pelo conselho, “tem também, e acima de tudo, nos termos do artigo 180.ª da Constituição, de assegurar o cumprimento das leis. Foi isso que não fez”.
“Antes de tomar a decisão política de seguir ou não a indicação do CSMJ – uma decisão que o Presidente da República é livre de tomar, repete-se – o mesmo Presidente da República deve aferir da legalidade das propostas que lhe apresentam, e nesse ponto que o seu poder é vinculado. Deve afastar nomeações feridas de ilegalidade”, defende.
Considera mesmo que o Presidente da República “manteve a ilegalidade precedente” do CSMJ por “não ter aferido a legalidade” do ato.
A ação popular administrativa de Rafael Marques surge na sequência do subscritor ter entregado em 10 de julho passado uma participação legal ao Procurador-Geral da República com vista à tomada de medidas jurídicas referentes à nomeação de Carlos Cavuquila, participação que “até à data não obteve qualquer reação”.
O Tribunal Constitucional angolano indeferiu recentemente, através do acórdão nº843/2023, um requerimento judicial da Ordem dos Advogados de Angola (OAA) que apontava “ilicitudes” da nomeação do referido juiz e a consequente anulação do ato.
A corte do Tribunal Constitucional fundamentou o indeferimento da pretensão da OAA devido à “inexistência de processo ordinário prévio”.
A nomeação e posse de Carlos Cavuquila, que já foi diretor nacional dos Registos e Notariado e administrador municipal de Cacuaco (Luanda), tem sido contestada em vários círculos da sociedade civil e políticos angolanos.