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Sábado, 12 Novembro 2022 13:37

Disputa de poder na Unitel envolve milhões de dólares e ainda não acabou

A nacionalização das participações da Vidatel e da Geni não acabou com o litígio. Falta definir a titularidade dos dividendos que há por distribuir ou as indemnizações que o decreto autoriza. Poderá estar a negociar-se um acordo em que nenhuma das partes saia mal desta história.

A disputa na UNITEL não acabou com a nacionalização. Em causa estão centenas de milhões de dólares que Isabel dos Santos e o general Dino não vão abdicar de forma pacífica. De acordo com o que o Expansão apurou, esta luta pelo dinheiro vai fazer-se em três áreas. A primeira tem a ver com a titularidade dos dividendos que existem para distribuir dos anos de 2019, 2020 e 2021, o processo de 2018 também foi contestado pela Vidatel, sendo que o valor aproximado dos lucros é difícil de estimar porque os relatórios e contas da telefónica não são públicos.

Apesar de o Expansão os ter pedido a diversas entidades, não foi possível obtê-los, nunca nos chegaram a entregar, apesar de nos terem confirmado que estavam aprovados. Por isso a informação que trazemos aos nossos leitores, é que de acordo com uma fonte da gestão da empresa, e tendo em atenção que a Geni e a Vidatel, tinham 25% da empresa, podem estar em causa para este período cerca de 800 milhões de dólares devidos a cada uma das instituições.

No despacho de nacionalização não há qualquer referência a este facto da titularidade dos dividendos a distribuir de anos passados, mas o assunto já terá sido discutido entre as partes envolvidas antes da publicação do decreto-lei.

A segunda área desta batalha será a das indemnizações. Os dois decretos de nacionalização da Geni e Vidatel abrem a porta "ao pagamento da indemnização quando e se devida, nos termos da lei.", lê-se. Embora seja uma formulação bastante elástica, confirma a possibilidade do Estado em avançar para o pagamento de uma verba compensatória às duas empresas. Mas quanto?

E aqui está outra das divergências entre as partes, directamente relacionada com a terceira área onde também se vai fazer esta batalha - o valor da empresa e consequentemente o valor dos 25% do capital social que a Geni e a Vidatel tenham na telefónica nacional. É esta estimativa que verdadeiramente separa o Estado, Isabel dos Santos e o general Dino, e que impede que até este momento tenha havido entendimento entre partes, como existiu em outros processos de recuperação de activos.

Impugnação do decreto presidencial

De acordo com um dos juristas intervenientes neste processo e que nos pede o anonimato, "a República de Angola define-se como sendo um Estado democrático e de direito, que se subordina à Constituição e funda-se na legalidade, devendo respeitar e fazer respeitar as leis. Por outro lado, o Estado deve respeitar e proteger a propriedade privada das pessoas singulares ou colectivas e a livre iniciativa económica e empresarial. Estes princípios constitucionais foram reafirmados pela Lei nº 13/22, de 25 de Maio, que introduz a figura da apropriação, por nacionalização, de activos do sector privado, para defesa do interesse público".

E acrescenta de forma convicta: "Como corolário destes princípios, qualquer acto do Estado, susceptível de ser visto como lesivo de direitos ou interesses privados, pode ser impugnado nos tribunais. Quer isto significar que a Geni e a Vidatel podem, querendo, impugnar o Decreto Presidencial que determina a apropriação das suas participações sociais na Unitel, embora a Lei nº 13/22, de 25 de Maio, atribua a este recurso um efeito meramente devolutivo, ou seja, o recurso, enquanto não for decidido, não suspende a execução da medida objecto de recurso. Portanto, a nacionalização pode não significar, ainda, o fim dos litígios, envolvendo alguns dos accionistas da Unitel e o Estado. A grande diferença é que, daqui para a frente, os litígios passam a ser entre esses accionistas, por um lado, e o Estado, por outro, estando a Unitel, como empresa, completamente fora de tais litígios".

Para se entender o que poderá acontecer daqui para a frente, cabe recordar os argumentos do Estado relativamente a estas nacionalizações escritos nos decretos 256/22 e 257/22. "Tendo em conta que neste momento se encontram pendentes acções judiciais pendentes contra parte dos accionistas, dificultando por isso relações comerciais, nacionais, estrangeiras, deteriorando assim a situação financeira da empresa;

Visando o asseguramento das decisões necessárias para a continuidade do negócio, através de um modelo de gestão mais eficiente, transparente e alinhado com o interesse estratégico representado pela empresa;

Havendo a necessidade de transferir as participações sociais para o Estado com vista à salvaguarda do interesse público e continuidade de fornecimento com qualidade deste bem essencial à população;

Esgotadas todas as possibilidades de acordo com o accionista visado e havendo concordância do outro accionista, sendo por isso a presente apropriação o meio mais adequado, necessário e proporcional para a salvaguarda da situação jurídica da empresa e garantia do interesse do Estado".

São estes os argumentos que Isabel dos Santos e o general Dino terão de rebater, embora de acordo com o que Expansão apurou se poderá estar perto de um entendimento em que nem os primeiros saem com a ideia que perderam tudo, receberão mesmo uma verba significativa, e o Estado também não sai com a imagem que terá cedido, o que implica o silêncio dos primeiros face aos valores que poderão vir a receber.

Cabe acrescentar ao apropriar-se, por via de nacionalização, das acções da Vidatel na Unitel, atribuindo os direitos de representação delas emergentes ao IGAPE (Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado), colide frontalmente com a sentença decretada pelo tribunal das Ilhas Virgens Britânicas. Obviamente, os procuradores nomeados pela instituição poderão, querendo, impugnar o presente Decreto Presidencial por via judicial. Mas isso não deverá acontecer, até porque parece cada vez mais evidente que o próprio tribunal quer "livrar-se" rapidamente desta situação, que não ajuda à imagem do País, nem contribuiu para que os milionários de todo o mundo continuem a usar esta off-shore. Expansão

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