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Sábado, 28 Junho 2014 08:40

Jornal de Angola ganhará o concurso de “piorzinho” como se comporta - Raul Danda

Excelência Senhor Presidente da Assembleia Nacional;

Ilustres Auxiliares do Titular do Poder Executivo;

Caros Colegas Deputados;

Minhas Senhoras e meus Senhores:

A pedido do Grupo Parlamentar da UNITA, tal como aconteceu com o primeiro debate mensal realizado neste Parlamento, os Deputados desta Maga Casa reúnem-se para debater “O Papel da Comunicação Social Pública num Estado Democrático de Direito”.

A ausência, nesta sala, de Sua Excelência o Senhor Ministro da Comunicação Social, em cumprimento do estabelecido na Lei; a ausência até dos principais gestores da média pública, mostra bem o desprezo total que merecemos do Executivo. Afinal, quem pode ou não respeitar a Lei? Quem pode ou não desrespeitar a Lei?

O assunto em debate hoje, quaisquer que sejam os resultados que venha a produzir, gordos ou magros, se os houver, é de uma importância extrema para o equilíbrio e a estabilidade de qualquer país, e do nosso de forma muito particular. Os angolanos todos estavam à espera que este debate fosse transmitido em directo, para informação cabal do que vamos aqui discutir hoje. Aliás, uma carta nesse sentido foi endereçada, há dias, a Sua Excelência, Senhor Presidente da Assembleia Nacional, pelas 4 forças políticas na oposição parlamentar; uma carta que, muito infelizmente, não obteve resposta. Este debate estará a chegar a todos os angolanos? Não! Logo mais, a média pública, essa mesma média pública, irá, com as tesouradas do costume, levar ao consumo dos cidadãos os trapos de sempre.

O Grupo Parlamentar da UNITA solicitou o agendamento deste debate por achar que podíamos e devíamos ter uma comunicação social pública, onde todos nos revíssemos; que traduzisse as ideias de todos os quadrantes políticos no país. Por um lado, para estar em conformidade com a Constituição e a Lei, e, por outro, para se conformar com as mais elementares regras de deontologia, ética e verticalidade. Solicitámos este debate porque constatámos, nós os Deputados, e constatam quotidianamente todos os angolanos, que os órgãos de comunicação social púbicos têm estado a prestar um péssimo serviço ao país, pelas razões que a seguir enumero:

1. A excessiva partidarização desses órgãos que, sendo do Estado (com o sentido que isso encerra), vivendo dos recursos de todos nós, de todos os angolanos, comportam-se como se ainda vivêssemos em dias de Partido-Estado, onde só vale ser do MPLA. Compenetrar-se da ideia de que esse tempo já passou e não voltará jamais, quaisquer que sejam os saudosismos alimentados aqui ou ali, parece ser um parto difícil. Essa partidarização que empurra muitos dos profissionais, uns para a arena do mercenarismo, outros para o palco do conformismo, para proteger o “pão”, o emprego que não cessa de minguar neste país, sobretudo para os autóctones, que vêm as parcas oportunidades surripiadas por estrangeiros (basta ver que até o trabalho de mão, o trabalho primário, que podia bem ser feito por angolanos, é feito por estrangeiros); essa partidarização, portanto, leva os órgãos públicos a colocarem-se visível e vergonhosamente de um lado político do país – o do MPLA e do regime por si suportado – atacando, violentando, maltratando todos aqueles que “ousem” pensar de forma diferente.

Ou seja, vivem do nosso dinheiro, comem do nosso pão, e empregam todos os seus esforços para nos combater, para nos atacar.

2. A informação veiculada por esses órgãos é parcial, e nada isento. Contém invariavelmente deturpações grosseiras, um sem-fim de manipulações e omissões. No meio deles, o Jornal de Angola ganhará certamente o concurso de “piorzinho”, se tivermos em conta a forma reles, baixa e perigosa como se comporta. Será culpa dos seus profissionais? Certamente não! É culpa, sim, do calcanhar político-partidário a sufocar permanentemente a sua orientação editorial, e que fez do nosso único diário a coisa mais descredibilizada neste país. O Jornal de Angola – e temo-lo dito reiteradas vezes – anda sempre de gasolina e fósforo na mão a incendiar a pradaria. Está permanente à procura de anti-paz, quando esses encontram-se justamente nas suas instalações. Meia dúzia de estrangeiros, a ganharem muito bem (mais do que ganhariam nos seus países de origem, certamente), empenham-se quotidianamente a encontrar formas e fórmulas para incendiar o país. Ontem, foi assim, com o “bater no ferro quente”; hoje começa a anunciar-se assim com os claros incitamentos à violência, colocando os angolanos uns contra os outros. E, curiosamente, buscam gente da PIDE aqui e ali, quando os agentes dessa organização hedionda, agora com outras vestes, estão acoitados naquele edifício, na Mutamba.

Mas poderia o quadro ser diferente?

Quando a Constituição diz, no Nº 3 do seu Artigo 44º, sob a epígrafe “Liberdade de Imprensa”, que, e eu cito: “O Estado assegura a existência e o funcionamento INDEPENDENTE e qualitativamente competitivo de um serviço público de rádio e de televisão” – fim de citação, o Jornal de Angola, num dos enxames de editoriais do seu Director-Geral diz, de forma clara e inequívoca, que a legitimidade do “nosso” Jornal está na maioria eleitoral que o MPLA conseguiu nas eleições de 2012; uma assunção que confirma o que os angolanos dizem de existência de uma clara colagem político-partidária do único quotidiano do país. Como poderíamos nós ter um quadro diferente com toda essa confusão propositada de conceitos?

3. Não há contraditório nos órgãos públicos, apesar da promessa feita nesse sentido, por Sua Excelência o Senhor Ministro da Comunicação Social – que infelizmente para cá não quis vir – aquando dos debates sobre o Orçamento Geral do Estado para 2014. Ou o Senhor Ministro se esqueceu da promessa afeita, ou então estamos muito mal, quando promessas feitas a esse nível não têm pernas para andar. A TPA e a RNA organizam debates onde os participantes fazem uma espécie de jogral, limitando-se, esses participantes, a completarem-se nas suas asserções, tal é a forma igual de pensar e de ver as coisas.

4. Cada vez que se tece uma crítica ao Titular do Poder Executivo, por menor que seja, é só esperar pelo dia seguinte para ver os editoriais venenosos, como se fazer uma crítica fosse um crime; como se todos tivéssemos de elogiar mesmo o que está visivelmente mal; como se todos tivéssemos de pensar da mesma forma. Falta pouco para chegarmos aos níveis de “abertura democrática” da Coreia do Norte, onde todos os cidadãos ficam obrigados a fazer o mesmo corte de cabelo que o jovem Presidente Kim Jong-Un, raspado nos lados e arrepiado em cima!

5. A Constituição e a Lei obrigam os órgãos de comunicação social a darem um tratamento igual aos Partidos Políticos. Quem lê o Jornal de Angola, ouve a Rádio Nacional de Angola ou vê a Televisão Pública de Angola, conseguirá vislumbrar isso?

6. Nas campanhas eleitorais, enquanto todas as outras forças políticas contam apenas com o tempozinho de antena a que têm direito por lei, ao MPLA é dado todo o dia, com propagandas e marketings de “Angola Faz”, que nem no dia da votação se calam.

7. A promiscuidade existente, em muitas províncias, onde directores de órgãos de comunicação social públicos são, simultaneamente, directores provinciais – casos do Huambo, Bié e Malanje – desfazendo-se a fronteira entre o estatal, o governamental e o partidário, quando não assistimos a situações onde é clara e vergonhosamente proibida a publicitação de actividades a realizar por partidos que não o MPLA, chegando a ponto de serem devolvidos montantes pagos para publicidade, como aconteceu já várias vezes em Cabinda, porque a Rádio Provincial recebeu proibição directa de publicitar uma actividade da UNITA, por parte do Secretário Provincial da Comunicação Social – já que o “estatuto especial” para Cabinda faz com que os Directores nas outras províncias mudem de nome e sejam “promovidos” a “Secretários”.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional,

Ilustres Deputados:

Os órgãos de comunicação social públicos, de livre vontade ou sob orientação das “ordens superiores”, contrata estrangeiros para atacar angolanos, pôr os angolanos uns contra os outros, insultar os angolanos na sua própria terra, a troco de avenças chorudas. Isso é admissível?

Tenho aqui comigo a cópia do contrato com um cidadão português; cidadão contratado pelas Edições Novembro-EP, que detêm o Jornal de Angola para atacar e insultar angolanos, na sua própria terra. Aufere um salário mensal de 8.000,00 Euros, o equivalente a mais ou menos 10.500,00 dólares americanos; é-lhe pago um montante de 150.000 kwanzas, por mês, para “despesas de manutenção de residência, pelo que recebe mensalmente 12.000,00 dólares. Para além disso, ele tem direito a um subsídio de férias de 8.000,00 Euros; um subsídio de Natal no mesmo valor de 8.000,00 Euros; tem seguro de saúde e o Jornal de Angola paga-lhe 3 viagens anuais de ida e volta para Portugal, para passar férias. E isso, a troco de “Exercer as funções de técnico superior de comunicação e de jornalismo, na qualidade de prestador de serviços nas áreas de consultadoria, formação, assessoria técnica e jornalismo” – estive a citar. Enquanto isso, mantém uma total independência do Presidente do Conselho de Administração das Edições Novembro-EP, já que, à luz do contrato, ele não é “trabalhador subordinado, nem funcionário, nem agente” de quem o contrata. A minha pergunta é: quanto ganharão os profissionais angolanos? É essa a forma que o Executivo encontrou de proteger os trabalhadores angolanos?

Senhor Presidente da Assembleia Nacional,

Ilustres Deputados:

Os profissionais da comunicação social pediram-nos para trazermos a este debate o seguinte, que não será certamente novidade pois eles tiveram o cuidado de dizer isso mesmo à nossa 6ª Comissão Especializada de Trabalhos:

Como é do domínio público, existe uma Lei de Imprensa (a Lei nº 7/06, de 15 de Maio), principal instrumento de regulação do sector. No entanto, é uma norma que consagra princípios gerais, carecendo, para sua eficácia, de regulamentação.

A Lei de Imprensa devia ser regulamentada em 90 dias, nos termos do artigo 87º desse mesmo diploma. Porém, sete anos depois, muitos “90 dias” depois, o Executivo, responsável pela regulamentação da Lei, ainda não o fez. E como consequência, temos:

a) Um exercício do jornalismo desregulado, não existindo uma entidade para fiscalizar o cumprimento das normas éticas e deontológicas. Em razão disso, assiste-se a um exercício jornalístico que configura uma verdadeira ameaça à paz social – são os profissionais da comunicação social que o dizem.

b) Órgãos de comunicação social públicos, que deviam ser exemplo, pois não deviam perseguir outro interesse que não fosse o público, consagrado no artigo 11º, nos seus pontos 1 e 2, da Lei de Imprensa, mas que se têm posicionado como se de órgãos partidários se tratassem – são os profissionais da comunicação social que o afirmam.

c) Ausência da Comissão da Carteira e Ética, dependente da aprovação dos Estatutos dos Jornalistas Angolanos, que abre portas para todos as pessoas exercerem o jornalismo, o que configura uma ameaça para a sociedade – são os profissionais da comunicação social que o dizem.

d) Não regulamentação da Lei de Imprensa, que impede que haja uma Lei de Televisão, embora exista já um canal privado - TV Zimbo - desde 2009, não se sabendo, ao certo, em que termos foi licenciado, na ausência de um instrumento legal que oriente o Executivo. A existência da TV Zimbo viola o artigo 59º da Lei de Imprensa. O mesmo se prende com a Lei da Radiodifusão, cujo diploma vigente está ultrapassado pela realidade sócio-política.

e) Um jornalismo hoje exercido sem qualquer instrumento eficaz de auto-regulação. O Código de Ética e Deontologia Profissional, aprovado pelas associações, em 2004, conforme estabelece a Lei de Imprensa, no seu artigo 21º, alínea a), é, em si, ineficaz, pois, da sua violação, resultam consequências disciplinares, que deviam ser impostas a quem assim procedesse. Não existindo este instrumento, têm os profissionais toda a “liberdade” para atropelar o mesmo, como acontece diariamente em vários órgãos de comunicação social.

f) Sem este instrumento, as incompatibilidades que se assistem na classe são variadas, com assessores de diversos ministérios e instituições privadas a exercerem jornalismo, violando o disposto na Lei de Imprensa e no Estatuto dos Jornalistas, vigentes.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional,

Ilustres Deputados:

Para colmatar todas essas lacunas, foi realizado um trabalho abrangente, exemplar, digno desse nome, que envolveu todos os sectores da comunicação social no país, e mesmo da sociedade civil. Refiro-me ao “Pacote Legislativo da Comunicação Social” que contou com o empenho reconhecido da ilustre Deputada Carolina Cerqueira, quando em funções de Ministra da Comunicação Social. Eu devo perguntar ao actual Ministro da Comunicação Social em que gaveta terá escondido tão belo trabalho, e quais as razões desse procedimento, já que o pacote já devia, há muito, ter sido trazido para este Parlamento, para aprovação.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional,

Ilustres Deputados:

Os profissionais da Comunicação Social no país são de opinião que – e a 6ª Comissão ouviu isso mesmo – a media pública está excessivamente partidarizada, estando mesmo sequestrada pelo poder; e essa tem de ser a principal questão a debater aqui, já que, da forma como as coisas estão e andam, a media estatal só pode assim ser considerada se olharmos para a origem do seu financiamento. Só nisso.

Senhor Presidente da Assembleia Nacional,

Para que este debate não morra estéril, o Grupo Parlamentar da UNITA vai remeter, nos próximos momentos, um projecto de resolução que pode ajudar na resolução – passe a repetição – dos problemas aqui diagnosticados.

Devíamos todos lutar para inverter esse quadro pois, como dizia Lúcio Aneu Séneca, “não é por as coisas serem impossíveis que não ousamos; é por não ousarmos que as coisas são impossíveis”.

Muito obrigado, Senhor Presidente.

Luanda, 27 de Junho de 2014.-

Raúl M. Danda

Presidente do Grupo Parlamentar da UNITA

Unitaangola

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