"Angola parece ser o próximo país mais em risco de entrar em incumprimento financeiro, devido à sua elevada dívida em moeda estrangeira e exposição à China", escreveu David Omojomolo numa análise aos processos de reestruturação da dívida de vários países africanos.
No comentário, enviado aos investidores e a que a Lusa teve acesso, Omojomolo vinca que "o progresso relativamente rápido das conversações com os credores sobre a reestruturação da dívida do Gana contrasta com as lentas experiência da Etiópia e da Zâmbia", o primeiro país a entrar em 'default' na sequência dos impactos da pandemia de covid-19, em 2021.
A diferença no andamento, salienta, "pode ser explicada pelo papel da China nas discussões, mas os credores privados também têm sido duros", num contexto em que o Enquadramento Comum, uma espécie de mapa sobre como devem ser as negociações para a reestruturação da dívida, "se mostrou incapaz de colmatar as diferenças entre as perspetivas dos diferentes tipos de credores".
Em dezembro, a Etiópia tornou-se o terceiro país africano a entrar em 'default', quando falhou um pagamento da dívida, mas já antes várias instituições e bancos de desenvolvimento defendiam que era preciso encontrar um novo modelo que funcionasse quando um país é incapaz de pagar as suas prestações de dívida.
Para David Omojomolo, uma das questões que criou o acréscimo de dificuldade nos processos de reestruturação da dívida tem a ver com a mudança da composição dos credores, que são cada vez menos bilaterais e oficiais, ou seja, países e instituições financeiras multilaterais, e cada vez mais credores privados.
"Parte das questões refletem o facto de o cenário dos credores ter mudado dramaticamente nas últimas décadas desde meados dos anos 2000, quando a maioria dos credores eram os governos do G7, mas agora, os credores privados, excluindo os da China, são líderes em termos de empréstimos aos governos, e a China tornou-se o maior credor bilateral", escreve o analista.
O gigante asiático, aliás, é uma peça fundamental no quadro das dívidas, já que "o grau de exposição à China parece ser um denominador comum para as demoradas negociações com a Etiópia e a Zâmbia", países que têm 17,4% e 29,4%, respectivamnete, do total da dívida à China, enquanto o Gana deve apenas 2,2% da sua dívida aos chineses.
O sistema multilateral financeiro, argumenta David Omojomolo, "não está à altura" e a sua falta de eficácia limita os resultados e prejudica os credores e também os países, uma vez que "não apresenta um mecanismo que obrigue os credores a ser mais transparentes sobre as concessões oferecidas, o que é fundamental para assegurar a comparabilidade dos termos" entre os credores oficiais e os privados.
O resultado, acrescente, "é que estas economias continuam arredadas dos mercados financeiros internacionais, com cada governo a ficar cada vez mais dependente de financiamento concessional, o que no caso da Etiópia está a empurrar o país para longe do sistema multilateral do Ocidente, como ficou demonstrado na adesão aos BRICS e no pedido de mais empréstimos provenientes da China".
O resultado, conclui, é que estes países "deverão operar abaixo dos níveis pré-pandémicos nos próximos anos e vão ser obrigados a um ajustamento financeiro para garantir os níveis de sustentabilidade da dívida ligados aos programas de ajuda financeira do Fundo Monetário Internacional, o que vai abrandar o crescimento económico".