O presidente e cofundador da Frente de Libertação do Enclave de Cabinda - Forças Armadas de Cabinda (FLEC/FAC), morreu esta sexta-feira de madrugada num hospital em Draveil, arredores de Paris, indicaram fontes familiares citadas no portal noticiosa e-Global.
Nzita Tiago, 88 anos, nasceu a 14 de julho de 1927 em Mboma Lubinda, Cabinda, enclave angolano limitado a norte pela República do Congo e a leste e a sul pela República Democrática do Congo.
O funeral do líder histórico da luta pela independência de Cabinda será realizado num cemitério da capital francesa, disse hoje à agência Lusa fonte familiar, após o corpo ser autopsiado.
"Em princípio, o funeral será em Paris. Não sei se poderá vir a ser trasladado para Cabinda", referiu Jean-Claude Nzita, porta-voz do movimento. "Cabinda está sob ocupação (angolana). Se libertarem Cabinda, então irá pensar-se nisso. Mas nunca sob ocupação angolana, pois (Nzita Tiago) passou toda a vida a combatê-la e nem sequer tem passaporte angolano. É cidadão gabonês", acrescentou.
Nzita Tiago sempre disse que a luta pela independência de Cabinda nunca visou o povo angolano mas sim o regime de Luanda.
Esse foi, a partir de determinada altura, nomeadamente após a independência, o discurso do presidente da FLEC/FAC. Na véspera da independência de Angola, vendo que Cabinda não entraria no quadro da descolonização portuguesa, Nzita Tiago inicia uma guerra de guerrilha contra as forças angolanas no enclave, apoiadas por tropas cubanas.
Depois de um longo período de atividade política no antigo Zaire (atual República Democrática do Congo), juntamente com Patrice Lumumba, Nzita Tiago participou na criação, em 1963, da FLEC em Ponta Negra, República do Congo. O homem, que nunca aceitou o passaporte angolano comandou os destinos do movimento de guerrilha, conseguindo sobreviver às inúmeras fações em que se dividiu a luta pela secessão do enclave angolano entre o Congo e a RDCongo.
Com o desaparecimento de Nzita Tiago, levanta-se agora a escolha do sucessor e das novas lutas para a liderança do movimento.
Inspirado em Amílcar Cabral, "pai" das independências de Cabo Verde e da Guiné-Bissau - "a nossa luta não é contra os portugueses, mas sim contra o regime colonial português" -, Nzita Tiago nunca encontrou da parte de Luanda qualquer disponibilidade para negociar um centímetro do "celeiro petrolífero" de Cabinda.
"Cabinda não é Angola" foi outra das frases que Nzita Tiago utilizava na diplomacia internacional que, porém, à semelhança do regime de José Eduardo dos Santos, nunca lhe deu ouvidos, com Portugal à cabeça.
A FLEC luta pela independência de Cabinda, alegando que o enclave era um protetorado português, tal como ficou estabelecido no Tratado de Simulambuco, assinado em 1885, e não parte integrante do território angolano.
Nzita Tiago defendia que foi Portugal quem "entregou" Cabinda aos angolanos e que os cabindas "não aceitam o neocolonialismo" de Luanda.
Criada em 1963, a organização independentista dividiu-se e multiplicou-se em diferentes fações, efémeras, com a FLEC/FAC a manter-se como o único movimento que mantém a resistência armada contra a administração de Luanda.
Em fevereiro deste ano, a FLEC/FAC emitiu um comunicado em que anunciava a retomada da via militar em Cabinda e alertava a comunidade internacional de que "Cabinda é um território em estado de guerra" onde a circulação de pessoas era "seriamente desaconselhada", segundo o Expresso.
Segundo o movimento, o regresso à força devia-se ao "silêncio de Angola a todos os convites para o estabelecimento de um diálogo alargado com todas as forças vivas cabindesas" que visasse "a negociação de um acordo para a paz para Cabinda".
Em abril, a FLEC/FAC anunciou que tinha morto 47 militares das Forças Armadas Angolanas durante um conflito em Cabinda e declarou a zona como em "estado de guerra". A informação não foi confirmada pelas Forças Armadas Angolanas.
Atualmente, Nzita Tiago vivia em Paris, sem nunca ter aceitado o passaporte angolano ou o estatuto de exilado político de Angola. Era cidadão gabonês.
Mas antes de se exilar em Paris, a luta pela independência, primeiro de Angola e, depois de Cabinda, ainda lhe valeu, durante o regime colonial português, uma detenção na cadeia de São Nicolau, a única prisão a céu aberto em Angola, onde a PIDE-DGS, a então polícia política portuguesa, torturou muitos nacionalistas.
Quando é posto em liberdade, em 1974, abre um escritório da FLEC na cidade de Tchiowa, capital de Cabinda. Um ano depois, a FLEC forma um governo provisório que proclama a independência de Cabinda de Portugal, sob o lema "Cabinda não é Angola. Vamos continuar a luta até nos libertarmos da escravatura angolana".
Mas quem ganha terreno no enclave é o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), na altura liderado pelo primeiro presidente do país, Agostinho Neto.
LUSA