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Segunda, 02 Setembro 2024 12:26

Analistas vaticinam uma transição radical e profunda no MPLA

O primeiro encontro com os secretários dos Comitês de Ação do MPLA veio confirmar o suposto isolamento que o Presidente João Lourenço está a viver e o afastamento do núcleo duro composto maioritariamente por militantes da Velha Guarda que se mostram desaludidos com a gestão e o rumo que o Partido está a seguir. Esta é, de resto, a conclusão de alguns observadores e analistas, atentos aos bastidores deste encontro, que juntam os militantes das bases do Partido, cuja convocatória revela a preocupação do líder dos camaradas com o desmoronar das infraestruturas partidárias.

Segundo as nossas fontes, o Presidente João Lourenço confirmou durante este encontro o envolvimento do antigo secretário-geral do MPLA, Dino Matross, numa suposta campanha de desestabilização interna do Partido, uma informação já desmentida pelo próprio Dino Matross, em declarações esta semana à Agência Lusa, tendo considerado tais acusações como infundadas.

João Lourenço também é citado como tendo desmentido que esteja alinhado e consertado com o General Higino Carneiro, tendo condenado o facto de estar a dizer nas suas amizades que a sua candidatura é consertada com o Presidente da República. No seu discurso, o líder do MPLA apelou à manutenção da unidade e coesão interna do Partido para combater tentativas de divisão, reafirmando a aposta nos jovens para ascenderem a vários cargos, incluindo o de Presidente da República.

O jurista Luís Jimbo não tem dúvidas em afirmar que a convocatória deste encontro com os Comitês de Ação, em última hora, foi para alinhar o pensamento do líder em relação ao polêmico caso da sua sucessão.

Segundo Luís Jimbo, a primeira é preciso considerar que esta reunião, este encontro nacional com os CAPs, acontece num contexto político interno e dinâmico do MPLA, que é relevante ter em conta que houve muito debate sobre a intenção ou não do Presidente João Lourenço querer um terceiro mandato. E esta questão foi esclarecida, logo no início do mês de julho, pelo portavoz, de que não há a intenção de um terceiro mandato, porque há um impedimento constitucional muito claro. E daí iniciou-se internamente no MPLA corridas para a sucessão da liderança do partido e da candidatura para a Presidência da República.

Ouvimos vozes de muitos atores interessados no MPLA e se especulou também muitos nomes de muitas pessoas. Só que este ambiente de competição interna e democrática de muitas candidaturas do MPLA é um desafio muito grande, é uma ameaça também por causa dos interesses de grupo, as consequências do combate à corrupção. E em volta de tudo isto, o líder do MPLA, o Presidente João Lourenço, entendeu, veja, há um mês atrás, anunciar o Congresso Extraordinário, exatamente para permitir, na consequência de que não haverá nenhum terceiro mandato, Até porque ele afirma que neste Congresso Extraordinário não haverá renovação de mandatos.

Jornalista Arão Ndipa: Não, então aqui ainda me estou a referir à razão pela qual este encontro foi chamado de última hora.

 Eu considero assim que foi chamado de última hora para alinhar esta posição da liderança do Presidente João Lourenço nesta conjuntura de competição interna à associação do MPLA. Porque se criou a expectativa quando foi anunciado o Congresso deste ano, pelo Bureau Político Extraordinário, que não houve uma agenda em concreto deste Congresso.

E foi um Congresso decidido pelo Bureau Político porque as CAPs estavam a sair de uma atividade política, de renovação de mandato, e isto não estava na agenda. Por isso, o Presidente teve que voltar a chamar as CAPs para colocar esta questão da sucessão, a discussão da sucessão no MPLA, ou seja, no essencial, quem será o candidato do MPLA em 2027? É o mote político da situação.

E com este encontro, o Presidente do MPLA deixou claro a sua intenção política, a sua linha política, e para isso tudo indica que o Presidente João Lourenço vai continuar a ser Presidente do MPLA.

Jornalista Arão Ndipa: Luís Jimba ajuda-nos a perceber, por outro lado, a indicação deixada por João Lourenço quanto à aposta nos jovens para ascender a vários cargos, inclusive de Presidente da República. O também especialista em assuntos eleitorais sublinha o facto das convicções do Presidente do MPLA condicionarem outros potenciais candidatos, principalmente da geração dos mais velhos.

Esta discussão que se vai fazer em novembro, agora está claro, é de que o líder do partido não terá de ser necessariamente o número um da lista. E aqui o Presidente João Lourenço deixou bastante claro que o número um da lista vai ser jovem e vão estar mulheres. Vamos ser os primeiros da lista jovens e mulheres.

E isto deixa muito claro de que a pretensão de uma certa grupo, que já pronunciaram publicamente, por esta caracterização não ser jovem...

Jornalista Arão Ndipa: Pois, aqui estamos a falar daqueles candidatos eventualmente da velha guarda, digamos, havia nomes como do próprio Higino Carneiro, que ponderou, de facto, assumir esta candidatura a liderança do MPLA.

Mas eu diria que tem muitos outros também com potencial. Tem o Gigi, que foi o presidente da bancada parlamentar. Tem o Nando, que foi o presidente da Assembleia Nacional. Tem o Olhar...

O próprio Antônio Venancio, não é? Sim, ou seja, há um grupo de individualidade no MPLA que tem, sim, tem forte presidencialismo. E tem seguidores, olha, tem...

Não sei se ve o que eu também vejo, que está a projetar-se no espaço social através da sua fundação, o Bonito de Souza. Isso tudo tem intenções políticas, não é? E parece que fica bastante claro que na posição do atual presidente do MPLA nenhum destes será sucessível na sua convicção política.

Jornalista Arão Ndipa:  E aqui... Mas isso vai depender da vontade de João Lourenço, neste caso.

Sim, isso está claro. Aqui a vontade do presidente João Lourenço, naquilo que eu posso perspectivar, é promover uma, vamos dizer, uma transição radical, profunda, para o MPLA sobreviver. Porque o MPLA tem desafios de ideologia, de comportamento, de governação. Todos estes problemas estão dentro do MPLA.

Os grupos de uns contra outros. E me parece que, na visão do presidente João Lourenço, é criar uma profunda ruptura sobre isso. A gente até deu o exemplo da sucessão de António Agostinho Neto para o anterior presidente José Eduardo Santos, que dirige o país muito jovem, não é?

Mas está a preparar e preparou o CAP para dizer que estamos numa situação de profunda transição. E é isto que agora vamos assistir como estes grupos de interesses vão se posicionar até o congresso de novembro deste ano. Mas este congresso está definido agora a agenda.

Jornalista Arão Ndipa:  Entretanto, o analista político Albino Pakisi entende que João Lourenço deve respeitar os estatutos do MPLA e promover múltiplas candidaturas no interior do partido. Albino Paquice prevê igualmente desafios muito difíceis para os últimos anos de liderança do presidente do MPLA.

Penso que é uma indicação para o futuro. Desde embora a referência que o presidente faz de 1979, penso eu, quando foi o seu camarada Neto. E o presidente José Eduardo Santos ascendeu com 37 anos de idade.

Portanto, foi numa altura em que havia uma emergência. Tinha morrido um presidente e era preciso ocupar imediatamente o cargo. E o presidente Neto tinha deixado indicações de que este jovem, este rapaz, era o rapaz indicado para efetivamente assumir esse cadernal no caso de acontecer alguma coisa.

Hoje é possível pensar na juventude. Há muita juventude que tem demonstrado capacidade para trabalhar. E nós atualmente temos jovens com o presidente da república na Casa Civil.

Temos, portanto, o Adão Almeida e tantos outros jovens a ocuparem cargos de relevância. Mas é preciso também dizer hoje que...

Mas acha que estes jovens estão preparados politicamente para assumirem os desafios da liderança do país?

Pois Arão, aí é onde está o grande problema. Porque os nossos países são complexos. E o nosso país Angola é um país complexo, onde dois partidos políticos têm a sua elite política já.

A UNITA e o MPLA tem a sua elite política. No MPLA há uma elite política jovem. E é preciso dizer elite política, porque são jovens que têm assumido cargos de muita responsabilidade.

Portanto, a eles se percebe que têm capacidade para fazer mais. Depois, a manutenção do próprio poder, por conta de muito poder instalado também, pode complicar muito. Então, é aí onde eu entendo que, mesmo que se olhe para a juventude, eu acho que o presidente, ao invés disto, devia abrir a possibilidade de respeitar os estatutos de direito.

Qualquer candidato se pode, portanto, aproximar o cadeirão máximo no partido. Porque o partido MPLA, neste momento, precisa de uma pessoa forte, depois de João Lourenço. E aqui temos que sublinhar, Arão, o presidente João Lourenço é, de facto, um presidente de transição.

Vai transitar mesmo. Ou seja, vai ser muito difícil agora e duro o que ele vai ter que fazer. Mas é preciso que, se ele fizer cumprir os estatutos, nós vamos ter vários candidatos.

E isto, de alguma forma, vai passar uma imagem, Arão, muito curiosa, essencialmente, muito imitativa daquilo que tem sido. Aliás, que tem sido feito pelos partidos na oposição, essencialmente, a UNITA. Que é cumprir os estatutos.

Neste momento, há muitas pessoas que se querem apresentar, naturalmente, à presidência do partido. E as pessoas estão à espera que o líder diga, vamos cumprir os estatutos. Eu penso que seria melhor assim.

E mesmo ali, se aparecerem jovens, que o presidente diz que eu apoio este e aquele, pelo menos cada um dos candidatos, membros do partido, poderão, efetivamente, apresentar aquilo que é a sua pretensão. Essa é a minha ideia, Arão, sobre esta matéria. Qualquer observador atento consegue perceber que as elites não estão com o presidente, portanto, João Lourenço.

Porque o presidente João Lourenço começou com uma campanha contra as elites. Não podemos nos esquecer que ainda já é Eduardo Santos vivo. Ele diz, não, nós vamos combater a corrupção, mesmo que os que tenham que cair primeiro são os nossos camaradas.

Mesmo que este discurso, foi um discurso que depois alterou. O presidente depois alterou. Ou seja, foi cooptar membros, dentro do mesmo partido político, que não estavam bem nas graças do presidente Eduardo Santos.

E são estes que hoje mandam no partido, de alguma forma. E que, mesmo do ponto de vista econômico, têm várias facilidades. Nós temos conversado com muitos antigos amigos pessoais, empresários ligados ao presidente Eduardo Santos, que hoje têm as portas completamente fechadas para muita coisa.

Então, eu penso que sim, não é toda a elite que está com o presidente João Lourenço, mas a elite mais dura não estará. Inclusive, de figuras que, no princípio, tinham a esperança de estar com ele para estabilizar, e muita coisa, hoje não estão com ele. Mas é preciso fazer uma coisa, Arão, aqui.

Ele precisa ter a inteligência de perceber o seguinte. Nem todo mundo lhe vai perseguir depois de 2027. Então, tem que ter a capacidade de, hoje, começar a conciliação, que é preciso nestes dois anos, que é em política há dois anos, e que vale há dois dias.

Ele tem que fazer essa conciliação com camaradas como mesmo o próprio Eugênio Carneiro, tem que fazer essa conciliação com camaradas como o Eugênio Carneiro, o próprio Nandó, que ainda está bem com ele, o próprio Dino Matross, o próprio Leopoldo Nascimento. Ou seja, há figuras com as quais ele tem que fazer a conciliação, porque o futuro político dele, depois de 2027, vai depender muito destes camaradas. Até porque, doutor Albino Paquiste, João Lourenço também é citado como tendo desmentido que esteja eventualmente alinhado ou consertado com o general Eugênio Carneiro, e tendo condenado o facto de estar a dizer, nas suas amizades, o próprio general Eugênio Carneiro, que a sua candidatura é consertada com o Presidente da República.

Sim, está bem. Eu ouvi isto. Mas, Arão, vamos convir.

O MPLA tem estatutos. E o líder presidente de jornalismo, neste momento, do MPLA, não está acima dos estatutos. Não está acima dos estatutos.

O general Eugênio Carneiro, se tivesse candidatado, é livre de fazer, por conta da disciplina partidária, naturalmente. Não precisa de depender do João Lourenço. Nem pouco mais ou menos.

Não precisa. E eu, Arão, deixe-me dizer-lhe, enquanto analista político, eu admiro-me como é que figuras como, por exemplo, o Eugênio Carneiro, ou o próprio Nandó, ou então o Leopoldo Nascimento, ou então figuras que têm militância, pelo menos mais de 15 anos de militância no Partido. Temos o caso específico do próprio Bornito de Sousa, que poderia, eventualmente, também sonhar a...

Não, não é sonhar, Arão, não é sonhar. É um direito dos militantes. É um direito o Bornito de Sousa, neste momento, e tantos outros militares.

Mas o Bornito de Sousa, Antônio Venâncio e outros, quer dizer, eles têm o direito. Porque os estatutos conferem que todo militante, com cotas pagas, com regularidade no Partido, sem processo disciplinar, pode se candidatar. O que tem admirado a mim é, por exemplo, figuras como o Carlos Calhau e tantos outros, que, sendo militantes do Partido, não digam não, eu quero apresentar o melhor projeto para o Partido, quer dizer, e para o país, futuramente, se são eleitos presidentes.

Faz-me muita confusão que figuras como estas, que têm poder no nosso país e são reconhecidas e conhecidas, ainda dependam que o líder diga que... Mas isso depende da decisão da partidária. Mas essa decisão da partidária, Arão, isto é que é importante dizer, não pode ser confundida com ditadura partidária.

Muitas vezes há essa confusão.

Jornalista Arão Ndipa:  Por sua vez, o analista político Agostinho Sicato considera que o discurso de João Lourenço só veio confirmar a existência de algumas práticas nocivas no interior do seu Partido, algumas das quais que se refletem a nível da governação com consequências negativas na imagem do país.

O presidente João Lourenço fez importantes denúncias, interna, tanto se dúvidas existiam. O presidente João Lourenço mostrou claramente que há determinadas práticas nocivas dentro do Partido. Aquilo que se combate cá fora, a nível do Estado, está essencialmente realizado pelo próprio Partido.

Por exemplo, do tráfico de influência. É preciso recordar, por exemplo, que a nível do Estado, hoje, os juízes que participaram recentemente da formação dos juízes na sua distribuição, nós ouvimos reclamações dos juízes selecionados para as grandes entidades, como é o caso do ANGRA, tanto aqueles que eram próximos das verdadeiras lideranças. E os outros foram retirados para não ter um pouco desse tráfico de influência que se fala a nível do Estado e a nível do Partido.

O presidente João Lourenço mostrou claramente que é exatamente isto que acontece. Os boatos são realmente confirmados. De um lado, chamar a atenção que isto não pode prevalecer e, do outro lado, também destrói aquela mensagem de esperança interna que os militantes que fizessem, que os militantes poderiam, então, ascender aos cargos.

Portanto, aos cargos. Olhando para estas práticas que o próprio presidente João Lourenço denunciou e condenou, podemos também ficar com a ideia de que todos estes grandes malas que são transversais à sociedade angolana, não há isto exatamente no Partido que governa o país. Sim, mas então o país que nós temos é uma referencia do Partido.

Ou seja, é uma imanação do Partido no poder. É uma imagem, isto, em realidade, do Partido que governa. Os malos que todos os países têm e é referência, exatamente, daquilo que acontece dentro do próprio Partido.

E, como se não bastasse, o presidente João Lourenço se, de um lado, precisava apostar uma mensagem interna de que a coisa não continuaria assim, mas para cá fora mostrou diferente. Portanto, o presidente João Lourenço foi contra um discurso que havia feito, coisa de três anos, quando dizia que o Partido não pode ser uma aposta de entrada para a inspecção.

Jornalista Arão Ndipa:  Finalmente, Agostinho Cicato analisa os contornos da oposição interna no MPLA e a posição de João Lourenço em relação às elites do Partido.

São aqueles rumores que surgiam já há algum tempo e que o próprio Partido várias vezes nunca assumiu publicamente. Claro, negou. No caso meu, na primeira ação.

Mas quem veio para o discurso do presidente, mesmo aquele discurso da mensagem negativa, de desestabilizar o país, para uma interpretação a pouco mais profunda, percebe-se que o presidente João Lourenço nem queria se referir aos seus opositores diretos, cuja ação é conhecida. Tanto ele queria exatamente dirigir-se até o grupo que é a oposição interna do seu próprio Partido. Mas saber, vamos entender, que não é verdade a situação como no caso do MPLA, tanto que o pior que se pode esperar é o anonimismo.

Portanto, é normal que hajam estas forças vulgares para alimentar exatamente a democracia interna. Há mais velhos, claramente, que não concordam e já mostraram isso publicamente. Estas tendências internas, de alguma forma, podem dificultar aquilo que são as ideias que já são admitidas, portanto, de uma possibilidade de um terceiro mandato que João Lourenço possa eventualmente vir a assumir, alterando a Constituição?

O discurso do presidente João Lourenço demonstra claramente que ele vai fazer uma aposta. Vai apostar a um jogo. E às vezes é preciso perceber o que é que o político quer dizer.

Só falta ao presidente João Lourenço indicar quem é a sua aposta. Talvez, num momento certo, o tirar. Pelo menos, isso ficou claro no discurso, porque o presidente João Lourenço há estas camadas no modelo em que eles se referem.

Você está aqui a dizer ao jovem que seja um delfim de João Lourenço? A princípio, as lideranças devem parecer os ideais que eles têm nos vários. Agora, resta saber se este seu delfim será também de opção para a aceitação interna da estrutura do Partido.

Agostinho Cicato, Albino Pakisi e Luís Jimbo foram os convidados desta edição. De Luanda para a Voz da América, Arão Ndipa.

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