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Sábado, 20 Agosto 2022 09:13

Eleições: Campanha está "morna", tem "vícios" e continua "desequilibrada" - analistas

Entre “morna” e “com vícios”, passando por “desequilibrada”, é a classificação que analistas contactados pela agência Lusa dão à forma como está a decorrer a campanha para as eleições em 24 de agosto em Angola.

O economista Jonuel Gonçalves é de opinião que está a decorrer de forma “morna” e isso reflete-se na falta de “propostas inovadoras” dos líderes políticos.

“Em primeiro lugar, esta campanha eleitoral parece-me a mais morna de todas, todas mesmo, desde o acordo de Bicesse para cá. As próprias lideranças políticas raramente lançam alguma coisa que tenha impacto, que não seja o velho discurso de todos eles, de governo e oposição. Esta é a primeira constatação. A segunda é o desinteresse a nível da sociedade, que talvez se vá interessar, como acontece muitas vezes, no próprio dia de voto”, considera.

“Depois temos um terceiro problema, que é, no caso de haver abstenção, não se vai conseguir saber quais são os níveis exatos. E já tivemos isso em 2012 e 2017. É que é muito difícil tirar os mortos da lista e são dois milhões. É muita coisa”, acrescenta.

Para Jonuel Gonçalves, “há o risco da reutilizar o nome de alguns mortos".

"Há até uma brincadeira que se faz: em Angola quando a gente se regista eleitoralmente, nunca mais sai da lista, nunca mais, por exemplo, há todas as atualizações que se pedem a cada eleição e que as pessoas vão lá novamente registar-se, mas quem não vai também mantém o nome lá. Eu fiz a experiência comigo e o meu nome também está”, exemplificou.

Eugénio Costa Almeida, investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa, vê “predomínio do partido maioritário e simultaneamente do Governo”.

“Supostamente, de acordo com a Constituição, de acordo com a lei, os membros do Governo não podem fazer campanha eleitoral como membros do Governo simultaneamente, mas nós sabemos que isso é uma verdade de La Palisse. É criticável, mas não há nada a fazer”, acrescenta.

E depois, nota, “há linguagens que são inapropriadas numa campanha que se espera que seja cordial, forte e acutilante, mas ao mesmo tempo cordial”.

“Nós sabemos que a campanha acaba sempre por às vezes ultrapassar um bocadinho os limites normais e naturais da verdadeira realidade, mas que não entre na velha questão de ‘ou nós ou a guerra’ e ‘ou nós ou uma crise política militar’”, frisa.

O analista Herlânder Napoleão, formado em Ciência Política em Londres, vê “muitos vícios” na campanha eleitoral.

“Eu acho que é um processo que está eivado de muitos vícios. Primeiro porque temos uma comissão eleitoral que não é independente. Porque são pessoas que foram de certa forma indicadas para estar nesta posição que acabam por macular o processo eleitoral. Outro ponto é a forma como se estão a conduzir os aspetos relacionados com a comunicação social”, aponta, referindo-se ao que considera ser o tratamento desequilibrado em favor do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e do seu candidato e atual Presidente da República, João Lourenço.

Herlânder Napoleão é de opinião que a comunicação social angolana favorece “nitidamente o MPLA”.

“Setenta por cento do tempo é consumido pelo MPLA porque em Angola se confunde o papel do Presidente enquanto Presidente da República com o de presidente do partido. Vai para a campanha, usa os meios do Estado, leva a TPA, leva a TV Zimbo [canais de televisão públicos], leva os jornais, leva tudo atrás”, acusa.

Herlânder Napoleão lamenta a falta de debates durante a campanha eleitoral.

“Adalberto Costa Júnior, candidato da UNITA, não foi convocado para nenhum debate, tanto na televisão como na rádio em Angola. Quando se questionou o Presidente João Lourenço, por que isso não acontecia, ele disse que o candidato é que teria de manifestar a intenção de ser entrevistado e pedir aos órgãos de comunicação social quando na verdade devia ser o contrário”, exemplifica.

Daí que se esteja perante “aspetos fulcrais que, de certa forma, começam por beliscar um processo eleitoral que deveria ser justo, transparente num ambiente de alguma harmonia, porque infelizmente em Angola, à semelhança de muitos países africanos, a democracia, digamos assim, só se consolida, na ótica destes senhores, com um ato de ir votar numa democracia”, diz.

Mais de 14 milhões de angolanos, incluindo residentes no estrangeiro, estão habilitados a votar em 24 de agosto, na que será a quinta eleição da história de Angola.

Os 220 membros da Assembleia Nacional angolana são eleitos por dois métodos: 130 membros de forma proporcional pelo chamado círculo nacional, e os restantes 90 assentos estão reservados para cada uma das 18 províncias de Angola, usando o método de Hondt e em que cada uma elege cinco parlamentares.

Desde que entrou em vigor a Constituição de 2010 que não se realizam eleições presidenciais, sendo o Presidente e o vice-presidente de Angola os dois primeiros nomes da lista do partido mais votado no círculo nacional.

No anterior ato eleitoral, em 2017, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) obteve a maioria com 61,07% dos votos e elegeu 150 deputados, e a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) conquistou 26,67% e 51 deputados.

Seguiram-se a Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), com 9,44% e 16 deputados, o Partido de Renovação Social (PRS), com 1,35% e dois deputados, e a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), com 0,93% e um deputado.

A Aliança Patriótica Nacional (APN) alcançou 0,51%, mas não elegeu qualquer deputado.

Além destas formações políticas, na eleição em 24 de agosto estão ainda o Partido Humanista (PH) e o Partido Nacionalista da Justiça em Angola (P-Njango).

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