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Quinta, 20 Fevereiro 2020 18:49

Caso CNE: "O Presidente João Lourenço devia ter vergonha", diz Raúl Danda

Em entrevista à DW, o deputado da UNITA Raúl Danda chama "corrupto" ao novo presidente da CNE de Angola, Manuel Silva Pereira. Danda anuncia resistência à nomeação e não descarta a hipótese de mais manifestações.

A União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) vai "continuar a refutar" a designação de Manuel Silva Pereira "Manico" como presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) de Angola, disse à DW Raúl Danda, deputado do maior partido da oposição. Na quarta-feira (20.02), em sinal de protesto, a oposição abandonou em bloco a Assembleia Nacional por considerar que o novo titular não cumpre os padrões de probidade para assumir o cargo.

O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), partido no poder, aprovou, sozinho, a tomada de posse do novo presidente da CNE. Em entrevista à DW África, Raúl Danda diz-se desiludido com o Presidente João Lourenço, a quem acusa de "estar a promover um corrupto". O deputado garante que a (UNITA) não vai baixar os braços. E se a nomeação de "Manico" não for anulada, Raúl Danda diz que um cenário bem provável é de novas manifestações em Angola.

DW África: A UNITA ainda vai tentar reverter esta tomada de posse do presidente da CNE?

Raúl Danda (RD): Bem, o que nós vamos fazer, obviamente, é continuar a refutar o sr. Pereira da Silva como presidente da Comissão Nacional Eleitoral. Não podemos aceitar isso. Não é um problema da UNITA. Não é um problema da oposição. É um problema de Angola e dos angolanos. Os angolanos não querem. Quem quer é o Presidente da República, tal como disse manifestamente. Porque quando o Presidente da República para uns casos diz tratar-se de um poder à parte, e respeita isto e aquilo, mas depois ordena praticamente à Assembleia Nacional que confira a posse a alguém que não tem idoneidade, nem moral, alguém que não cumpre os padrões da probidade, isso é gravíssimo. O combate que o Presidente João Lourenço propala contra a corrupção é falso, porque está a proteger alguém que é um corrupto.

DW África: A UNITA apelou ao Presidente da República que anulasse este concurso e que ouvisse os partidos da oposição. Ficaram desiludidos com esta resposta de João Lourenço?

RD: Muito desiludidos, porque percebemos que aquilo que o Presidente da República tem estado a dizer relativamente ao combate contra a corrupção é uma falácia, não é verdade. O sr. Manico, que tomou posse ontem perante os deputados do MPLA, e apenas desses, é alguém que tem uma auditoria, digamos assim, mandada instaurar pelo antigo presidente da Comissão Nacional Eleitoral, e que mostra claros desvios de fundos, despesas que ele realizou que não devia realizar, dinheiros que foi buscar. E estamos a falar em milhões de dólares.

DW África: À luz deste novo paradigma da observância da probidade em Angola e do combate à corrupção, esta pessoa, para a UNITA, não reúne condições para o cargo?

RD: Absolutamente. Não reúne condições nem para a UNITA, nem para ninguém. Aliás, este senhor, se tivesse tido uma nesgazinha de vergonha e de dignidade, nem teria sequer comparecido perante os deputados para que lhe fosse conferida a posse. Portanto, ou o homem é muito corrupto e por isso aceita aquilo, ou então é alguém que, francamente, não se dá valor nenhum. Eu não vejo como aquele homem chega a casa e olha para a família depois de tudo o que se passou ontem, aqui na Assembleia Nacional. Eu não sei como é que aquele homem consegue olhar-se ao espelho e gostar da imagem que nele vê refletido.

DW África: A UNITA pediu um debate de interesse político e urgente sobre esta questão. Vão insistir neste pedido de debate?

RD: Nós vamos insistir, mas sabemos que isto está a caír em ouvidos moucos. Muitos dos deputados do MPLA com quem estamos a falar também estão indignados com isso. Estão apenas no seguidismo político e partidário. É uma orientação da direção do partido e no topo do partido está o Presidente João Lourenço, infelizmente. Então eles seguem, mas muitos deles não estão de acordo com aquilo que se está a passar.

DW África: Que medidas legais podem os partidos da oposição tomar agora?

RD: Há um recurso que foi feito junto do Tribunal Supremo. Primeiro, o Tribunal Supremo mandou uma resposta à UNITA, mas não se sabe se veio do tribunal ou de uma praçazita ou de um mercado qualquer. Não sabemos de quem é, porque aquilo não está assinado, não tem nome de ninguém. Depois das reclamações, ouvidas também a nível da imprensa, o Tribunal Supremo enviou, não sabemos porque carga de água, uma carta ao presidente da Assembleia Nacional, a dizer que tinha respondido à UNITA. Não sei porque é que essa informação tem que vir para a Assembleia Nacional. Mas nós vamos insistir. A verdade é que a UNITA não pode aceitar. Os angolanos não podem, nem querem aceitar. Aliás, houve uma manifestação que se organizou ontem (10.09) frente à Assembleia Nacional, que foi reprimida, mais uma vez, num país que se diz democrático, onde o Presidente João Lourenço diz que existe a liberdade de se manifestar. O que é uma grande mentira: as pessoas foram reprimidas, foram espancadas, sairam daqui a sangrar, com gás lacrimogéneo, com cães à perna, etc., etc.

DW África: Depois dessa repressão que houve ontem, o grupo juvenil da UNITA vai tentar manifestar-se novamente contra a tomada de posse?

RD: Tendo em contra a frustração e o desagrado das pessoas, se não se fizer marcha atrás rapidamente com essa pretensão de manter um corrupto que querem mandar para poder violar e subverter a ordem constitucional por via de eleições fraudulentas, mais uma vez, eu acho que é o povo angolano que vai começar a vir para a rua para se manifestar. Não podemos continuar a aceitar, e o Presidente João Lourenço devia ter vergonha de se considerar Presidente numa eleição com fraude. Já devia bastar este mandato que ele está a cumprir, porque foi para lá com base numa fraude eleitoral flagrante, com base numa corrupção eleitoral de que ele próprio foi protagonista, à luz da lei que nós temos. Já devia bastar isso. Mas insistir em querer permanecer mais cinco anos no poder com base na fraude, isso é o cúmulo da pouca-vergonha. DW África

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