A hipótese de usar a "bomba atômica das sanções" para punir o Kremlin pela invasão da Ucrânia vinha sendo discutida por líderes ocidentais abertamente.
"Está absolutamente claro que a rejeição do petróleo russo vai levar a consequências catastróficas para o mercado global", afirmou na segunda Alexander Novak, um dos vice-premiês do governo Putin. "A subida dos preços será imprevisível. Será US$ 300 por barril, se não mais", completou.
O barril Brent, referência internacional, subiu de US$ 95 no dia do início da guerra para US$ 127 nos pregões desta manhã de terça (8). Com as maiores reservas (24%) do mercado, Moscou é a maior exportadora de gás natural do mundo. Tem a oitava maior reserva de petróleo (4,8%), mas é a segunda maior exportadora, atrás da Arábia Saudita.
Por óbvio, um choque dessa magnitude desestabilizaria o mundo de forma análoga às grandes crises dos anos 1970. O impacto inflacionário no Brasil já levou o governo a estudar medidas para tentar segurar o preço doméstico, o que é muito criticado.
Novak disse que o candidato para retaliação mais óbvio é o Nord Stream 1, gasoduto que leva até 55 bilhões de metros cúbicos do produto todo ano diretamente da Rússia para a Alemanha.
O segundo ramal do projeto foi completado em setembro, mas sua operação não chegou a começar sob alegações burocráticas que viraram uma decisão política quando a guerra estourou. A Gazprom, gigante estatal russa do gás, controla o projeto de US$ 11 bilhões, que tem participação de empresas alemãs, francesa, austríaca e britânica.
O Nord Stream 2 duplica a capacidade de envio de gás, reduzindo assim a dependência dos dois gasodutos da era soviética que levam o grosso do produto para a Europa por meio da Ucrânia. Mesmo com a guerra, eles seguem em funcionamento, e Kiev recebe até US$ 2 bilhões anuais em taxas de trânsito de Moscou.
Há anos os EUA criticam os europeus pela ligação energética com Putin, e empresas sócias do Nord Stream já sofreram sanções de Washington. Há quem veja oportunismo do governo de Joe Biden na tragédia ucraniana, já que há uma oportunidade para empresas americanas ampliarem o fornecimento de óleo à Europa.
Há uma miríade de outros projetos, como as plantas de liquefação de gás tocadas em conjunto pela França e pela Rússia no Ártico. A China, alheia às críticas, tem também estabelecido parcerias com a aliada Rússia.
Desde que iniciou sua agressão contra a Ucrânia, Putin sofreu um leque amplo de sanções econômicas. Os principais bancos do país foram desconectados do sistema internacional de pagamentos, cerca de 250 empresas estrangeiras deixaram a Rússia e mesmo o acesso do Banco Central aos US$ 640 bilhões de reservas cambiais foi degradado.
Mas, salvo algumas medidas para dificultar a produção como embargo tecnológico e a suspensão de refino de óleo russo em países nórdicos, o setor energético foi relativamente poupado. O motivo é óbvio: 40% do gás natural e cerca de 33% do petróleo consumidos na Europa vêm da Rússia, e isso não se substitui do dia para a noite.
Não que não haja impactos. Bancos europeus passaram a se recusar a financiar exportações russas, e o óleo mais produzido no país, o Urais, está sobrando com preço baixo no mercado.
Ainda assim, apesar de serem agudas no curto prazo e talvez administráveis no mais longo, as sanções não detiveram o esforço de guerra do Kremlin.
Na quinta-feira (10), os 27 membros da União Europeia se reunirão para discutir um plano para reduzir a dependência energética da Rússia e também aumentar os investimentos em defesa. A meta da Otan, a aliança militar do Ocidente, é que todos gastem ao menos 2% do PIB com o setor, o que apenas 10 de seus 30 integrantes fazem. BBC