São dezenas ou mesmo centenas. A grandeza exata do número é desconhecida, mas a realidade é que um número apreciável de angolanos e luso-angolanos têm com as contas bancárias congeladas pela justiça portuguesa há mais de três anos, por suspeitas de branqueamento de capitais.
Em muitas circunstâncias, os envolvidos desconhecem a teor da acusação que lhes é feita, na medida em que os processos nos quais estão envolvidos continuam em segredo de justiça.
Os visados estão, assim, impedidos de consultar os autos, ainda que em alguns dos casos nunca tenham sido notificados do despacho que sustenta a existência do segredo de justiça.
Uma exposição a que o Negócios teve acesso resume a situação. O denunciado diz compreender “que perante a identificação de uma factualidade que causou suspeitas tenha sido instaurado um processo de investigação penal e que tenham sido adotadas medidas cautelares e de apreensão”, mas acrescenta que “não pode acolher que perante o desenvolvimento de diligências, e certamente de informações de diversa índole o processo não avance, no sentido de permitir ao denunciado conhecer os factos que motivaram a apreensão dos saldos bancários e colocar-lhe um termo”.
Entre as situações identificadas pelo Negócios há casos que remontam a 2022 e continuam sem desfecho à vista. Em exposições enviadas ao juiz de instrução criminal e à Procuradoria- Geral da República, há quem se queixe de que a morosidade da justiça e o congelamento, que consideram injustificado, das contas está a ter reflexos nas respetivas vidas. Entre as consequências, há quem identifique a impossibilidade de
“Não respondem, não dizem nada”, desabafa um dos afetados pelo congelamento de contas.
Honrar os compromissos familiares, fazendo com que estas passem por privações que ponham em causa a sua dignidade.
O congelamento de contas de cidadãos angolanos começou depois de 2020, logo após a Procuradoria- Geral da República deste país ter decretado, a 30 de dezembro de 2019, o arresto preventivo de contas bancárias pessoais de Isabel dos Santos. “Há valores que, neste momento, estão cativos no exterior, podemos dizer que são mais de mil milhões de dólares à ordem de Angola, mas estão a seguir ainda os procedimentos legais necessários para que esse dinheiro fique de facto à disposição do Governo angolano”, dizia em julho de 2021, o PGR angolano, Hélder Pitta Grós.
Aliás, não são apenas cidadãos angolanos que se queixam do comportamento da justiça lusa nesta matéria. O gestor português Mário Leite Silva, que foi braço-direito de Isabel dos Santos, encontra-se na mesma situação e em julho de 2024, coincidindo com a visita do primeiro-ministro, Luís Montenegro, a Angola, escreveu um artigo de opinião no Expresso: “Sou um cidadão português a quem, há mais de 4 anos, as contas bancárias pessoais e as das minhas empresas foram congeladas a pedido da justiça angolana. Quatro anos depois, tendo sido prestados todos os esclarecimentos solicitados e ultrapassados todos os prazos razoáveis para tal situação, nada mudou”, denunciava então Mário Leite Silva, cujo processo se mantém em banho-maria.
No que se refere aos cidadãos angolanos, as contas congeladas são de montantes variáveis, uns na casa dos milhões de euros, outras de milhares, mas o tratamento das autoridades judiciais portuguesas é idêntico: “Não respondem, não dizem nada”, desabafa um dos envolvidos.
Jornal de Negócios