Sexta, 15 de Agosto de 2025
Follow Us

Quinta, 14 Agosto 2025 23:22

'Não estou nem aí', afirma Edir Macedo sobre suicídio de pastor da Universal

O bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) e dono da Rede Record, gerou revolta ao comentar, durante uma live, sobre o suicídio de um pastor da Universal na Bolívia. Ao falar sobre a morte de Lucas Di Castro, 35 anos, ocorrida no dia 5 de agosto, Macedo afirmou: “Problema é dele. Eu não sei. Não sei por que ele fez e eu não quero nem saber. Eu só quero saber daqueles que estão vivos. Morreu, acabou. Minha mãe morreu. Acabou, enterro e acabou”.

A declaração repercutiu nas redes sociais e gerou uma onda de críticas pelo tom adotado pelo bispo. 

Generais costumam ser empáticos com a morte de seus soldados em combate. Embora o bispo Edir Macedo defina a vida cristã como uma guerra, não demonstrou compaixão ao comentar a morte de Lucas Di Castro, 35 anos, pastor da Igreja Universal do Reino de Deus na Bolívia.

Os pastores estão sempre de plantão para atender chamadas emergenciais da comunidade, escutam desabafos, visitam doentes, realizam cerimônias fúnebres, coordenam campanhas assistenciais e fazem tarefas operacionais e burocráticas do dia a dia das igrejas. Burnout, depressão e suicídio de pastores são mais frequentes que se imagina.

A expansão das igrejas evangélicas tem sido objeto de debate nas últimas décadas no Brasil. Porém, pouco se sabe do custo emocional e mental pago por essa mão de obra religiosa que é responsável pelo sucesso de megaempreendimentos como a IURD ou de igrejas de garagem.

Um homem de terno cinza e gravata vermelha está falando em um microfone, em um palco. Ao fundo, há um grande logotipo azul com um símbolo que parece uma espiral. O ambiente é bem iluminado e parece ser um evento formal.

O tratamento dado ao caso pelo bispo Macedo contribui para que pastores que lutam com transtornos de saúde mental tenham receio de falar sobre o assunto e de buscar ajuda - Divulgação

Parte da população vê os pastores como pessoas que não trabalham e enriquecem com o dinheiro dos fiéis. Isso não é verdade. A maioria dos pastores trabalha duro e vive modestamente.

Em 2024, o Ministério do Trabalho do Brasil atualizou a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), passando a exigir a avaliação de fatores de riscos psicossociais no ambiente de trabalho. Essa avaliação inclui elementos como carga de trabalho excessiva, metas inatingíveis, jornadas prolongadas, ausência de suporte da liderança, assédio moral e sexual, conflitos interpessoais e insegurança no emprego.

Como pastor desde 1993, sei que riscos psicossociais estão presentes nos ambientes de trabalho religiosos. Embora algumas igrejas já reconheçam que seus pastores adoecem mentalmente e precisam de ajuda profissional, ainda é tabu a discussão sobre como as dinâmicas do trabalho religioso contribuem para os processos de adoecimento mental dos pastores.

Lucas morreu no dia 5 de agosto e Macedo comentou sua morte no dia 8 no Instagram. O tom do fundador da Universal sobre o suicídio do pastor é marcado pela irritação e por comentários críticos às pessoas que, segundo ele, "possuem uma fé emotiva e ficam de mimimi".

De modo exasperado, o bispo Macedo afirma que Lucas Di Castro "nunca foi pastor, ele tinha o título de pastor; mas ele nunca foi um homem de Deus, porque, se fosse, passaria pelos problemas como eu passei, aliás, eu passei por problemas piores que ele...".

O tratamento estigmatizante dado ao caso pelo bispo Macedo contribui para que pastores que lutam com transtornos de saúde mental tenham receio de falar sobre o assunto e de buscar ajuda profissional para tratamento. Afinal, se não conseguem superar os problemas somente pela fé, se afastam do padrão estabelecido pelo líder máximo da IURD.

Segundo Macedo, os pastores da Universal "recebem do bom e do melhor e são acompanhados com todo cuidado". Na sua fala há uma confusão entre controle gerencial episcopal e cuidados em saúde mental. O bispo afirma que se reúne pessoalmente com os pastores uma vez por semana. Isso é parte do problema, pois são reuniões para cobrar os pastores por metas que serão alcançadas à custa da negação dos sofrimentos psíquicos.

As condições de trabalho na IURD, igreja altamente hierarquizada, são diferentes de pequenas igrejas lideradas por pastores que se dividem entre o trabalho religioso e outras atividades profissionais para sustento financeiro. Todavia, sem deixar de lado essas diferenças, é preciso reconhecer que os pastores adoecem mentalmente e o ambiente laboral religioso está entre os fatores responsáveis pelo adoecimento.

"Não estou nem aí para a morte desse pastor", pontificou o bispo Edir Macedo, do pináculo da arrogância de quem construiu o Templo de Salomão, mas prefere ignorar o ensinamento bíblico: "chorem com os que choram". Folha SP

Rate this item
(0 votes)