As autoridades zimbabueanas deslocaram um forte dispositivo militar e policial para as principais artérias da capital, Harare, onde as demonstrações e protestos foram proibidos, culminando uma sequência de iniciativas repressivas, que se prolonga desde junho, como a detenção e alegada tortura de cerca de 160 ativistas e membros dos partidos da oposição, segundo a Amnistia Internacional e os advogados dos mesmos, sob a acusação de tentarem perturbar a cimeira da SADC.
Confrontado pela Lusa, um porta-voz do Gabinete dos Direitos Humanos das Nações Unidas, Seif Magango, fez saber que o gabinete “está preocupado com os relatos de detenções, perseguições e intimidações de defensores dos direitos humanos e ativistas políticos no período que antecedeu a cimeira da SADC”.
“Apelamos à libertação imediata de todas as pessoas detidas arbitrariamente, assim como à proteção do espaço cívico”, acrescentou o gabinete da ONU.
Num tom semelhante, os Estados Unidos, através da sua embaixada em Harare, sublinharam esta quinta-feira na rede social X “o seu apoio ao objetivo da SADC de alcançar o desenvolvimento económico, a paz e a segurança”, recordando que “a intimidação, a tortura e a detenção prolongada de cidadãos zimbabueanos antes de julgamento são contrárias a estes princípios”.
Setenta e oito pessoas, incluindo Jameson Timba, líder da oposição Coligação de Cidadãos para a Mudança (CCC), foram detidas sem direito a fiança em 16 de junho numa reunião política que as autoridades consideraram "não autorizada".
Em 27 de junho, um outro grupo de manifestantes que exigia a libertação dos membros da CCC detidos à porta de um tribunal em Harare foi também detido pelas forças de segurança.
Um tribunal em Harare recusou hoje a libertação sob caução de três ativistas - Namatai Kwekweza, Robson Chere e Samuel Gwenzi - pertencentes a um grupo de defesa dos direitos humanos, detidos em 31 de junho a bordo de um avião no aeroporto da capital do Zimbabué quando viajavam para participar numa conferência da sociedade civil. Os ativistas estão detidos sob a acusação de protestarem contra a detenção de Timba e dos 78 outros detidos em 16 de junho.
Não obstante este estado de coisas, é pouco provável que a cimeira de chefes de Estado e de governo dos 16 países - que incluem Angola e Moçambique - na região aborde as preocupações nacionais e internacionais sobre o historial dos direitos humanos do país anfitrião.
A cimeira decorre pela primeira vez no Zimbabué desde a criação do bloco regional de 16 países em 1992, e o chefe de Estado zimbabueano, Emmerson Mnangagwa, assumirá a liderança da SADC – igualmente uma estreia crucial para a sua administração -, sucedendo ao seu homólogo angolano, João Lourenço, que estará em Harare este fim de semana.
A cimeira decorre sob o tema “Promover a Inovação para desbloquear oportunidades de crescimento económico sustentado e desenvolvimento rumo a uma SADC industrializada”, mas o centro das discussões deverá incluir questões emergentes no domínio da saúde, como o número crescente de surtos de varíola no subcontinente.
Esta semana, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou os surtos de varíola em África uma emergência sanitária mundial, na qual assume particular relevância a situação na República Democrática do Congo (RDCongo, membro da SADC), onde se regista mais de 90% dos casos.
O vírus da varíola está presente na África Central e Ocidental há vários anos, mas este ano foi detetado em mais de uma dúzia de países africanos, alguns pela primeira vez.
Os cientistas identificaram também uma nova forma de varíola na RDCongo que poderá ser mais infecciosa. A OMS manifestou a sua preocupação com a possibilidade de a doença começar a ultrapassar as fronteiras internacionais e a Suécia registou o seu primeiro caso da nova variante.
O partido da Aliança Democrática da África do Sul, que faz parte do governo de coligação sul-africano, instou os delegados do país na cimeira a levantarem a questão da varíola. A África do Sul e outros países da África Austral registaram apenas alguns casos da infeção, mas a Aliança Democrática disse que o grande surto na RDCongo "mostra a rapidez com que a situação pode mudar".