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Quinta, 12 Janeiro 2023 11:36

Vídeo de militares moçambicanos a queimarem cadáveres é "horrível" - Amnistia Internacional

O vídeo que mostra soldados a queimarem cadáveres em Cabo Delgado é mais um “acontecimento horrível” que mostra o que está acontecer nesta “guerra esquecida” em Moçambique, considerou hoje a Amnistia Internacional (AI).

"Tragicamente, parece que incidentes de violência contra civis, execuções extrajudiciais e outras violações dos direitos humanos e do direito humanitário internacional ainda estão a ocorrer, como documentado anteriormente pela Amnistia Internacional", referiu, em comunicado, o diretor da organização defesa dos direitos humanos para a África Oriental e Austral, Tigere Chagutah.

Em causa está um vídeo, divulgado nas redes sociais, que mostra militares alegadamente do exército sul-africano e outros elementos desconhecidos a atirarem cadáveres para uma pilha de escombros a arder, um episódio que resultou na abertura de uma investigação pelas Forças Armadas da África do Sul.

"A queima de cadáveres pelos soldados é deplorável e é provavelmente uma violação do direito humanitário internacional, que proíbe a mutilação de cadáveres e exige que os mortos sejam eliminados de uma forma respeitosa”, acrescentou o responsável.

A AI defende que as forças moçambicanas e a força regional da Missão de Desenvolvimento da Comunidade da África Austral em Moçambique (SAMIM) “devem lançar uma investigação rápida, exaustiva e independente sobre as circunstâncias destas mortes e da queima dos corpos e qualquer pessoa contra quem existam provas admissíveis suficientes deve ser processada em julgamentos justos”.

Segundo o responsável, “a segurança em Cabo Delgado não deve ser feita à custa de violações dos direitos humanos".

Este ato já foi condenado pelos dois partidos de oposição moçambicanos com assento no parlamento, que repudiaram a “crueldade” e pediram “respeito pelos direitos humanos”.

“Queremos manifestar o nosso repúdio a esta crueldade. Não há razões para perpetrar violência deste nível”, disse à Lusa José Manteigas, porta-voz da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), maior partido da oposição em Moçambique.

Por seu lado, o porta-voz do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Ismael Nhacucue, disse à Lusa que “quando [os militares] filmam este tipo de atos e publicam, demonstram pequenez e indiferença ao real problema do terrorismo, ou seja, agem igual aos terroristas e não se pode permitir isso”.

O MDM pede que seja feita uma “investigação exaustiva” para a responsabilização dos “mentores da barbaridade”, alertando que a atitude dos militares pode criar “ódio e vontade de retaliação” nos grupos insurgentes.

A oposição criticou ainda o facto de o Estado moçambicano não se ter pronunciado sobre o caso, referindo que, como país anfitrião, Moçambique devia ser “o primeiro a posicionar-se”.

Também a organização não-governamental Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD) exigiu esclarecimentos e eventual responsabilização neste caso, repudiando “este crime macabro à luz da lei humanitária internacional, que estabelece regras claras sobre a atitude de militares perante soldados abatidos do grupo adversário”, disse à Lusa o ativista e diretor do CDD, Adriano Nuvunga.

Segundo uma nota da Força de Defesa Nacional da África do Sul (SANDF), o incidente, que já está a ser condenado pela oposição sul-africana, terá ocorrido em novembro de 2022 em Cabo Delgado, para onde a África do Sul destacou um contingente militar como parte da Missão da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) em Moçambique.

A província de Cabo Delgado enfrenta há cinco anos uma insurgência armada com alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.

A insurgência levou a uma resposta militar desde julho de 2021 com apoio do Ruanda e da SADC, libertando distritos junto aos projetos de gás, mas surgiram novas vagas de ataques a sul da região e na vizinha província de Nampula.

O conflito já fez um milhão de deslocados, de acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), e cerca de 4.000 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED.

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