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Quarta, 11 Outubro 2023 23:37

Angola precisa de dinheiro fresco do setor privado - Governo

A ministra das Finanças de Angola disse hoje que o país precisa de "dinheiro fresco na economia" e defendeu que é o setor privado que tem de ocupar o lugar que dantes cabia ao Estado.

"Precisamos de montantes elevados de injeção de dinheiro fresco na economia, é isso que precisamos" para relançar o crescimento económico, que deverá abrandar para 1,1%, segundo a revisão do Governo, ou 1,3%, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

Em entrevista à Lusa à margem da sua participação nos Encontros Anuais do FMI e do Banco Mundial, que decorrem esta semana em Marraquexe, Vera Daves de Sousa disse que "o Estado tem sido o principal motor, bombeando liquidez para a economia, mas com os níveis de endividamento atuais, já não tem essa capacidade".

A governante disse que a solução é "mais investimento que financiamento" e notou que as poupanças internas também são uma opção: "Angola tem definitivamente de encontrar o caminho da atração de investimento privado estrangeiro e de receitas de poupanças locais, que também existem", afirmou, lembrando que sempre que há emissões de dívida interna, o objetivo é alcançado.

Questionada sobre quais os principais aspetos a melhorar para retomar o caminho do crescimento mais robusto, Vera Daves de Sousa elencou alguns aspetos, que vão desde a criação de um ambiente de negócios mais propício até à desburocratização administrativa, passando também pelo reforço da segurança jurídica para os investidores e, principalmente, um papel maior para o setor privado.

"Havia a perceção de que tem de ser o Governo a fazer tudo, mas não, todos temos de fazer a nossa parte, quem tem capital e está no mercado tem de contribuir, são lançados programas, põe-se dinheiro nas instituições financeiras públicas, criam-se incentivos e benefícios fiscais, desburocratiza-se, e onde está o setor privado que não responde", questionou a ministra, respondendo à questão de porquê só nos últimos anos a aposta na captação de investimento estrangeiro ser mais visível.

Salientando a importância de confirmar que as reformas e as iniciativas simplificadoras "se refletem no quotidiano das instituições", a ministra defendeu que é preciso melhorar a implementação das leis, porque os parceiros internacionais dizem que Angola tem “ótimas leis, mas na aplicação ainda há espaço para melhorar".

Sobre a forte desvalorização do kwanza na primeira metade do ano, seguida de uma estabilização que entre maio e julho passou de 543 kwanzas por dólar para mais de 830, tendo permanecido nesse valor desde então, Vera Daves de Sousa diz que a explicação está entre o mercado livre, a descida da produção de petróleo e a especulação.

"Se ainda dependemos muito do setor petrolífero para ter acesso a moeda forte, e a principal fonte de acesso à moeda forte é a exportação de petróleo, e estamos a ver uma produção abaixo do esperado, então a equação é simples", argumentou, considerando também que houve "um ataque especulativo" sobre a moeda angolana.

"O que podemos fazer melhor, o Ministério das Finanças e o Banco Nacional de Angola, é ser mais diligentes a comunicar com o mercado e passarmos tranquilidade para quem está do lado da procura organizar-se de forma diferente e gerir melhor a sua atividade ir-se ajustando, é assim em qualquer parte do mundo, há volatilidade", concluiu.

Linha de crédito do Deutsche Bank a Angola podia ter corrido melhor

A ministra das Finanças de Angola disse que a linha de crédito do Deutsche Bank só foi usada em cinco projetos devido aos requisitos inacessíveis para empresas angolanas ou a operar no país.

"Podia ter corrido melhor", admitiu a governante em entrevista à Lusa em Marraquexe, Marrocos, à margem dos Encontros Anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, que decorrem esta semana.

"O financiamento do Deutsche Bank era uma linha de apoio ao setor privado operacionalizada pelo Banco de Desenvolvimento de Angola, e o nível de aprovações é relativamente baixo, confessamos, se forem cinco projetos aprovados é muito", revelou Vera Daves de Sousa, quando questionada sobre o nível de financiamento dado pelo banco alemão, precisando que o valor utilizado ficou abaixo dos 330 milhões de dólares (311,1 milhões de euros).

Este baixo nível de utilização da linha de crédito deve-se "muito por causa dos pressupostos que as empresas devem cumprir para terem acesso ao financiamento, é preciso usar equipamento alemão, enfim, há uma série de coisas, e são poucas as empresas angolanas ou que funcionam em Angola que conseguem atingir os requisitos do Deutsche Bank", disse a governante, salientando que apesar de ainda continuar em funcionamento, a linha financiou menos de um terço do montante total de mil milhões de dólares.

A abertura de uma linha de crédito, como esta que começou em maio de 2019, é um exemplo possível que Angola pode seguir para evitar mais financiamento, que implica um aumento da dívida, algo que o Governo quer evitar a todo o custo.

Questionada sobre se a emissão de dívida verde, ou seja, para projetos ligados ao ambiente, pode ser uma solução, Vera Daves de Sousa admitiu que o conceito é interessante, mas ressalvou: "Mas é mais dívida, o desafio de Angola agora é a dívida, o que temos de explorar são outras avenidas que não envolvam dívida, que envolvam capital, ou investimento privado, mas que não impliquem Angola ter de pagar juros e capital daqui a algum tempo".

O objetivo é fugir ao aumento do valor da dívida, que condiciona a despesa pública noutros setores necessitados, como a Educação ou a Saúde, e daí a necessidade de recorrer a outros meios, como garantias de entidades internacionais que tirem risco ao investimento externo, convencendo os investidores a apostar no país africano lusófono.

"Temos de ir fazendo a redução do risco do país para entrar capital que depois não deteriore as contas públicas de Angola, são essas coisas inovadoras que queremos explorar para mitigar a tensão que vamos ter nos próximos cinco a seis anos, em que o serviço da dívida vai representar um desafio", disse Vera Daves de Sousa.

Até final da década, Angola vai viver uma tensão permanente entre a necessidade de investir em infraestruturas e a vontade de controlar o endividamento: "Até 2029 vamos ter tempos de desafio e por isso vamos ter de ser criativos para endereçar o tema das infraestruturas, porque também não podemos parar tudo porque Angola é um país enorme com muitas necessidades, ao mesmo tempo que temos de ser conservadores para não agravar a nossa situação", resumiu a ministra das Finanças na entrevista à Lusa.

 
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