Em entrevista exclusiva à DW, a empresária angolana Isabel dos Santos, filha do antigo Presidente da República de Angola José Eduardo dos Santos, acusa o Estado angolano de ter colocado nas mãos dos jornalistas informações falsas no âmbito do caso Luanda Leaks.
Isabel dos Santos, que é alegadamente alvo de um mandado de captura internacional, nega que esteja arrolada em processos judiciais internacionais, afirmando que estão a decorrer em vários países "inquéritos" motivados pelas informações divulgadas no âmbito da investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI).
A ex-eurodeputada portuguesa Ana Gomes, que tem vindo a denunciar vários casos envolvendo a empresária angolana, diz que não correspondem à verdade as afirmações de Isabel dos Santos. Segundo a ex-eurodeputada, tudo o que foi revelado na investigação jornalística Luanda Leaks foi certificado antes.
DW África: As afirmações de Isabel dos Santos correspondem à verdade?
Ana Gomes (AG): O Luanda Leaks é uma investigação jornalística com base em revelações feitas pelo Rui Pinto. É uma investigação que tem a credibilidade do consórcio de jornalistas que tem estado por trás de revelações como os Panama Papers e os Paradise Papers, etc. Foi tudo verificado pelos jornalistas.
DW África: Mas Isabel dos Santos diz que foi o Estado angolano que forjou documentos falsos e os entregou aos jornalistas, que foram manipulados.
AG: Não é verdade. A principal fonte do Luanda Leaks é o jovem português Rui Pinto, que é também a principal fonte do Football Leaks. Toda a informação foi verificada e re-verificada por jornalistas. Para além de acionista de alguns dos bancos, com participações qualificadas, ela era também administradora de um banco em Portugal. E essa era obviamente uma posição ideal para poder fazer as operações de branqueamento de capitais dos recursos que eram desviados de Angola.
DW África: Isabel dos Santos nega que tenha roubado o Estado angolano, diz que criou a Unitel com fundo próprio e depois conseguiu empréstimos nos bancos para expandir o seu negócio.
AG: Ela era filha do Presidente de Angola. Ela nunca teria acesso aos recursos e às posições que teve nessas empresas e aos recursos do próprio Estado angolano se não fosse filha do Presidente angolano. Em termos da legislação internacional quanto ao combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, ela era uma pessoa politicamente exposta, exatamente pelas suas ligações ao Presidente angolano. Possivelmente, muito do dinheiro que ela investiu em Portugal, desviado dos recursos angolanos, era não só dinheiro dela, mas também do pai. Um dos esquemas a que a senhora Isabel do Santos recorreu foi o dos empréstimos, um esquema clássico para a lavagem de dinheiro - que sabia que vinha de origens contestáveis, muitas delas de recursos desviados do seu país e obviamente tendo a possibilidade de movimentar essas quantias porque tinha uma posição privilegiada sendo filha do Presidente de Angola e não por mérito próprio como empresária.
DW África: O que lhe parece o mandado de captura internacional alegadamente emitido pela PGR de Angola?
AG: Acho que esse mandado tardava da parte das autoridades angolanas, tal como tarda qualquer mandado de captura por parte das autoridades portuguesas. Qualquer indivíduo com fome que rouba uma galinha, é preso. No caso da senhora Isabel dos Santos, que contraiu empréstimos de milhões junto da banca portuguesa e deixou os bancos portugueses "a arder", até hoje não foi acionado nenhum procedimento por parte das autoridades judiciais portuguesas, o que eu acho inaceitável e que é também produto de uma cumplicidade política. DW África