Apenas um em cada 100 candidatos que se inscreveu em concursos públicos conseguiu ingressar na função pública entre o período de 2022 até meio de 2025, segundo cálculos do Expansão com base nos dados fornecidos pela Escola Nacional de Administração e Políticas Pública (ENAPP). Nestes quatro anos, a ENAPP realizou e concluiu um total de 11 concursos públicos, nos quais se inscreveram um total de 468.809 concorrentes para 3.254 vagas, e apenas 2.855 foram contratados. E 122.863 foram excluidos por não reunirem as condições exigidas.
Contas feitas, apenas 0,6% dos concorrentes inscritos conseguiu a vaga para a qual concorreu, sinal que espelha a real situação de desemprego no País, em que há uma procura por empregos muito superior à oferta. O que acaba também por contribuir para uma política de remunerações salariais muito baixas, com todas as consequências que isso traz para o País.
Há ainda outra questão que contribui para estas corrida a tudo o que é concurso para entrada na função pública, que é o facto de a maior parte dos angolanos considerar que o Estado é o melhor empregador e aquele que garante maior segurança e estabilidade já que é conhecido por nunca despedir trabalhadores, ao contrário do que acontece nos privados que andam "ao sabor" de uma economia em constantes altos e baixos, com crises financeiras sucessivas.
De acordo com o economista Heitor Carvalho, fica em evidência a escassez de empregos formais no País. "A taxa de emprego formal, ou seja, o número de pessoas que procuram emprego e conseguem é de 14%. Se excluirmos o emprego informal, teremos uma taxa de desemprego de 86%. Portanto, são esses que estão nos empregos informais e os desempregados que se inscrevem sempre que abre uma vaga nova. Logo, é esta desproporção entre a oferta de empregos formais e a população que quer trabalhar, que faz com que qualquer concurso tenha uma procura muito superior à oferta".
Esta desproporcionalidade, de acordo com o economista, deve-se ao facto de não se estar a criar novos empregos no País, apesar da narrativa criada à volta desta questão. "Não é o Governo que deve criar empregos, o problema é deixar que sejam as empresas a criar emprego. E não há empresas a criar empregos porque fazer negócios em Angola é muito difícil. O ambiente de negócios e as condições para fazer negócios são muito difíceis e por isso não há muita gente a querer investir em Angola", admite.
Diante disto, segundo Heitor Carvalho, o que se pode fazer é mudar as questões ligadas ao ambiente de negócios, "porque as regras são complicadas de se cumprir". Estas dificuldades levam a que muitas empresas se virem para a informalidade. E é importante lembrar que assim como as empresas se viram para o mercado informal diante das dificuldades do ambiente de negócios, a força de trabalho também acaba por sair da formalidade face à escassez de empregos que garantem segurança laboral.
Já o também economista Hermenegildo Quexigina, argumenta que o motor das economias dos paises é o sector privado e que o Estado deve apenas criar as condições necessárias para que este se desenvolva e fomente a criação de novos empregos. "De acordo com o inquérito ao emprego do Instituto Nacional de Estatística, nos primeiros seis meses deste ano, dos 6,1 milhões de jovens em idade activa 3,2 milhões estão desempregados, e tendo em conta que quase metade da população economicamente activa é jovem, é difícil prever um cenário de melhorias no mercado de trabalho. A população continua a crescer e não são criados novos empregos, temos cada vez mais jovens a formarem-se com perpectivas de conseguirem empregos, mas a realidade é que não temos postos de trabalhos para eles. Isso sem tocar na questão da qualidade da formação destes jovens", defende.
Além disso, o alto nível de informalidade e desemprego destapam outros problemas sociais e são um sinal de alerta sobre a incapacidade do País em aproveitar o seu dividendo demográfico que é a sua população jovem. Ao não criar essas condições abre a "porta" a mais pobreza e delinquência. Expansão