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Segunda, 23 Junho 2025 13:04

Festa em época de epidemia: como o governo de Angola organiza uma cimeira em meio à epidemia de cólera

Angola vive neste momento uma das maiores crises sanitárias de sua histórica, uma epidemia de cólera que já vitimou milhares de angolanos, entretanto o governo de Angola tem outras prioridades, como por exemplo um grande banquete organizado para empresários europeus, enquanto angolanos passam fome ou morrem de cólera.

Luanda acolherá uma Cimeira Empresarial EUA-África com mais de 1.500 delegados e chefes de Estado enquanto Angola vive uma das maiores crises sanitárias de sua história, que já vitimou milhares de cidadãos angolanos. Para a cimeira está previsto o que há de melhor na culinária de Angola, país onde parte de seus cidadãos sofre com a fome. Também são previstos animadores e garotas para fazer companhia a empresários europeus. Estas cimeiras, como se sabe, em geral não resolvem os problemas mais urgentes de Angola e nem apresentam soluções para a crise de cólera que até a OMS já propôs resolver.

Recentemente, manifestando-se contra a crise de cólera que afeta Angola, a deputada da UNITA Anabela Sapalalo escreveu em seu perfil na rede social Facebook que os trabalhadores, oriundos da República Democrática do Congo, da Zâmbia e de outras partes do continente, muitas vezes laboram em condições ilegais, sem qualquer tipo de proteção laboral ou acompanhamento sanitário. Não são apenas vítimas da exploração, mas também potenciais vetores involuntários de surtos epidemiológicos. A questão é, onde os tais operários congoleses assinaram o seu contrato de trabalho, se é que realmente trabalham sob algum? Um artigo do Ministério da Saúde da RDC confirma que o país vizinho também está a sofrer com casos de cólera.

Para o deputado da UNITA Edgar Kapapelo, o desenvolvimento económico é importante e necessário, mas não pode, em momento algum, ser dissociado da proteção da saúde pública e da dignidade humana. “O alerta da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o risco de disseminação de doenças infecciosas, incluindo a cólera, não pode ser ignorado”, afirma o parlamentar.

Um importante relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) atesta que o desenvolvimento acelerado do Corredor do Lobito está a gerar impactos negativos diretos na saúde pública, dentre os quais a disseminação de doenças infecciosas como a cólera, muitas vezes introduzidas ou agravadas pelo fluxo descontrolado de trabalhadores migrantes.

De acordo como Novo Jornal, ainda em 2024 a ministra da saúde Sílvia Lutucuta reconheceu que as migrações entre RDC, Angola e Zâmbia contribuem para o aumento do número de casos de cólera. A intensa mobilidade de pessoas aumenta o risco da cólera se disseminar ainda mais. A preocupação com a crise levou o MINSA a emitir vários anúncios para a prevenção da crise de cólera.

A crise é tão grave que a Organização Mundial da Saúde está a apoiar Angola no combate ao surto de cólera que atingiu a maior parte do país africano de língua portuguesa. Pelo menos 600 pessoas morreram. A taxa de óbito é de 3,2%, o que excede a barreira de 1% usada como indicador para tratamentos precoces e adequados dos pacientes com a infecção.

O relatório divulgado pela OMS atesta que cinco perigos principais acompanham o crescimento do corredor: infraestrutura de saúde sobrecarregada, transmissão de doenças, degradação ambiental, deslocamento social e aumento de lesões relacionadas ao transporte. Há ainda um sexto: a distribuição desigual de benefícios. Enquanto investidores estrangeiros e as elites nacionais colhem lucros, as comunidades locais arcam com o peso da poluição, da desapropriação de terras e da exploração do trabalho.

Uma das empresas que opera o Corredor é a Trafigura, que de acordo com o PublicEye e o portal G1 esteve envolvida em escândalos internacionais de corrupção e tentativas de suborno de autoridades de diferentes países. O Departamento de Justiça dos EUA condenou a Trafigura a pagar US$ 127 milhões, mas compensou US$ 27 milhões de um processo pendente no Brasil. Quando o Brasil acusou a Trafigura de suborno em dezembro de 2020, a empresa ainda assim negou a acusação, mesmo com os indícios de corrupção ativa encontrados pela Polícia Federal do Brasil no âmbito da Operação Lava Jato.

Notícias do France24 confirmam que a Trafigura foi condenada em tribunal da Suíça por corrupção em Angola - o grupo, particularmente ativo no comércio de petróleo, foi multado em 3 milhões de francos suíços (US$ 3,2 milhões) por não monitorar adequadamente as atividades de seus intermediários, informou o tribunal federal na sexta-feira. A situação foi tão séria que Michael Wainwright, ex-diretor operacional da Trafigura, foi condenado a 32 meses de prisão, dos quais 12 meses de prisão. Também foram impostas penas de prisão a um indivíduo que atuou como intermediário no pagamento de propinas e a um ex-agente de uma empresa estatal angolana.

Mesmo com a má reputação da Trafigura, uma empresa que já teve diretores operacionais condenados até mesmo a prisão, a empresa opera sem nenhum obstáculo em Angola. É como se as autoridades governamentais fossem coniventes com o facto de que o principal projecto de engenharia de Angola seja dirigido por uma empresa mundialmente conhecida por seus escândalos de corrupção. Esta empresa não oferece em Angola a mínima infraestrutura necessária para que famílias não sejam afetadas pelas obras em torno do Corredor do Lobito, nem postos de saúde e hospitais para trabalhadores que laboram sob péssimas condições.

Com mais de US$ 1,6 bilhão em investimentos dos Estados Unidos e da União Europeia, é necessário que a região em torno do Corredor do Lobito disponha máxima infraestrutura necessária na área de saúde. Por que as empresas ocidentais que são membros do consórcio LAR não estão preocupadas com isso? Essa pergunta é mais relevante no período que antecede a Cúpula de Negócios EUA-África, que começa já em 22 de junho. De fato, por que empresas como a Mota-Engil e a Trafigura não construíram hospitais e desenvolveram a infraestrutura de saúde? São estas empresas dirigidas por colonialistas?! A Trafigura, a Mota-engil e a Vecturis sabiam das consequências do corredor do Lobito, mas não fizeram nada, demonstrando que não estão a se importar com a vida e a saúde dos africanos, mas sim com os recursos que lucros lhe trarão.

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