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Quinta, 10 Mai 2018 15:41

Portugal se rende: Manuel Vicente vai ser julgado em Angola

O Tribunal na Relação decidiu esta tarde de quinta-feira enviar o processo do ex-vice-presidente Manuel Vicente para Angola. Vicente foi acusado em Portugal do crime de corrupção ativa de uma magistrado do Ministério Público, Orlando Figueira, que está a agora a ser julgado no Campus de Justiça, em Lisboa. Mas a defesa recorreu, alegando que o arguido não foi constituído arguido nem notificado da acusação. Além disso, gozava de imunidade política.

O Ministério Público (MP) acusou Manuel Vicente dos crimes de corrupção ativa, branqueamento de capitais e falsificação de documento no âmbito da Operação Fizz. Mas, no início do julgamento, o tribunal decidiu separar os indícios recolhidos contra ele para um processo autónomo. O julgamento dos restantes arguidos avançou e conta já com mais de 40 sessões, com o magistrado Orlando Figueira, acusado de ter sido corrompido por Manuel Vicente para arquivar os processos que tinha em mãos contra ele,  e com o advogado Paulo Blanco e o representante legal de Vicente em Portugal, Armindo Pires, acusados também pelo crime de corrupção por terem alegadamente intermediado os dois.

A defesa de Manuel Vicente, assegurada pelos advogados Rui Patrício e João Lima Cluny, recorreu, então, para o Tribunal da Relação que decidiu esta quinta-feira que o processo relativo ao ex-governante deve ser entregue às autoridades angolanas. Mais, que não podia o MP constitui-lo arguido e notificar da acusação porque tinha imunidade.

Caberá agora às autoridades angolanas decidir o que fazer relativamente às suspeitas que recaem sobre Manuel Vicente.

A questão tem agitado as relações diplomáticas entre os dois países, já que Angola reclamava há muito a imunidade do seu ex-vice-presidente e a transferência do processo para Luanda.

O que pedia a defesa

Os advogados de Manuel Vicente, Rui Patrício e João Lima Cluny, tinham recorrido para o Tribunal da Relação por três motivos não acolhidos pelo tribunal de primeira instância:

  1. o regime de imunidade do ex-vice Presidente angolano
  2. a separação do processo na parte respeitante ao recorrente
  3. a delegação do inquérito às autoridades angolanas

A defesa considera que em “momento algum” Manuel Vicente foi constituído arguido, confrontado com as suspeitas de que era alvo e que nem sequer foi sujeito a uma medida de coação. Mais, nem  foi notificado da acusação por corrupção ativa, branqueamento de capitais e falsificação de documento. E que o próprio Ministério Público ignorou “os regimes de imunidade”.

“O recorrente viu já hoje, neste tempo, o processo, em violação flagrante  do regime de imunidade de que a função de vice-Presidente de Angola beneficia, prosseguir contra si juntamente com os Arguidos sem que, em algum momento, tenha tido sequer o direito de aceder aos tribunais para exercer as suas garantias de defesa, com tudo o que isso também implica para a sua reputação, bom nome e dignidade”, lê-se no recurso.

Reação do primeiro ministro: Desapareceu o "irritante" entre Portugal e Angola

"Fico feliz que o único 'irritante' que existia nas relações entre Portugal e Angola desapareça", disse o primeiro-ministro

O primeiro-ministro afirmou esta quinta-feira que ficou feliz com a decisão judicial de transferir para Angola o processo que envolve o ex-vice-presidente angolano Manuel Vicente, considerando que desapareceu o único fator "irritante" nas relações luso-angolanas.

Numa declaração à agência Lusa, António Costa disse que a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo Operação Fizz, "é a demonstração de que vale a pena confiar no regular funcionamento das instituições judiciais para assegurar a boa aplicação da lei".

"Fico feliz que o único 'irritante' que existia nas relações entre Portugal e Angola desapareça", acrescentou à agência Lusa o primeiro-ministro.

Reação do MNE: Congratula decisão portuguesa "Efeito muito positivo na política externa"

Ministro dos Negócios Estrangeiros assumiu tomar "muito boa nota" da decisão da justiça portuguesa de enviar para Angola o processo do ex-vice-presidente angolano, Manuel Vicente

O ministro dos Negócios Estrangeiros português disse esta quinta-feira tomar "muito boa nota" da decisão da justiça portuguesa de enviar para Angola o processo do ex-vice-presidente angolano, afirmando que a relação bilateral poderá agora passar para "o nível mais alto".

"Esta decisão, encerrando um 'irritante', permite que a relação entre Portugal e Angola passe para o nível mais alto possível do relacionamento", afirmou à Lusa Augusto Santos Silva.

O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu hoje que o processo do ex-vice-Presidente angolano, Manuel Vicente, arguido na Operação Fizz, deve ser enviado para Angola.

"Tomo muito boa nota da decisão do tribunal, porque tem um efeito muito positivo na política externa", comentou Santos Silva, que começou por sublinhar que o Governo português "respeita inteiramente a decisão do tribunal", referindo que se "verifica mais uma vez que as questões judiciais devem ser tratadas em sede judicial".

O único obstáculo que existia no relacionamento bilateral ao mais alto nível deixou de existir.

Questionado se esta decisão permitirá agora que o primeiro-ministro, António Costa, visite Angola -- algo que já esteve previsto, mas ainda não se concretizou -- Santos Silva respondeu que "esse é um trabalho muito prioritário para a diplomacia portuguesa".

O chefe da diplomacia portuguesa afirmou que Lisboa e Luanda consideravam que, após a sua própria viagem a Angola em 2017 e da deslocação do Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, como convidado para a cerimónia de posse do novo Presidente angolano, João Lourenço, "agora o que faltava fazer era uma de duas coisas ou desejavelmente as duas coisas: uma visita do primeiro-ministro português a Luanda e/ou uma visita do Presidente da República de Angola a Portugal".

"Na diplomacia temos o encargo de preparar com o tempo e o profissionalismo necessário esses desenvolvimentos e é isso que estamos a fazer", adiantou.

Santos Silva afirmou que as relações entre os dois países "sempre foram boas, agora podem ser ótimas", recordando que Lisboa e Luanda têm "uma proximidade muito grande do ponto de vista político-diplomático, económico e social".

Advogados de Manuel Vicente satisfeitos com deslocação do processo para Angola

"Esta decisão pode contribuir para afastar qualquer possível clima ou ideia de desconfiança ou desconsideração entre sistemas jurídicos de Estados soberanos e cooperantes", lê-se num comunicado

A equipa de advogados que representa Manuel Vicente, ex-vice-presidente de Angola, reagiu à decisão Tribunal da Relação de enviar o processo que envolve o também ex-presidente da Sonangol para Angola.

Em comunicado, os advogados dizem que ainda vão analisar o "detalhe" da decisão, mas desejam "manifestar publicamente para já a sua satisfação com a decisão". "Não só por reconhecer razão ao nosso recurso e ao que sempre defendemos como podendo ser uma solução juridicamente adequada, mas também porque esta decisão pode contribuir para afastar qualquer possível clima ou ideia de desconfiança ou desconsideração entre sistemas jurídicos de Estados soberanos e cooperantes", lê-se ainda.

"Queremos também neste momento reiterar que as questões relacionadas com os mecanismos de cooperação entre Estados e com as imunidades não constituem prerrogativas ou privilégios pessoais, são sim questões de Direito e de Estado, às quais um ex-vice-chefe de Estado e atual deputado está naturalmente vinculado, sendo certo que continuamos convictos e empenhados na continuação da demonstração, no momento e pelos meios e no lugar próprios, de que o Sr. Eng. Manuel Vicente nada tem que ver com os alegados factos que quiseram imputar-lhe", dizem os advogados.

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