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Quarta, 03 Fevereiro 2016 20:36

Exclusivo: Emails confidenciais revelam como funcionava o BES Angola

O ex-coordenador do Departamento de Risco Global (DRG) do BES, Carlos Calvário, andou anos preocupado com a exposição do BES Angola (BESA) à dívida pública angolana. Afinal o BES chegou a investir até 1,8 mil milhões de dólares em títulos do tesouro de Angola.

Após sucessivos telefonemas para Álvaro Sobrinho, a 9 de Maio de 2009, Calvário decidiu escrever-lhe um longo email que também partilhou com Ricardo Salgado, José Maria Ricciardi, entre outros administradores e altos quadros do grupo BES.

Mas as queixas não tinham a ver só com os negócios com o estado angolano. "Recordo que, no final de 2008, tivemos de corrigir os reportes dos Grandes Riscos devido à exposição do BESA junto da Escom [uma empresa do universo BES fundada por Hélder Bataglia] não nos ter sido correctamente reportada. Essa correcção apenas foi possível devido às informações recolhidas pelo ESFG [Espírito Santo Financial Group]", lembrou em 2015 Carlos Calvário durante a inquirição como testemunha num processo de contraordenação aberto pelo Banco de Portugal (BdP) a propósito do caso BESA.

Cerca de 4h30 depois, Sobrinho respondeu pela mesma via a Carlos Calvário e também com conhecimento a Salgado e Ricciardi. A mensagem, a que a SÁBADO teve acesso, revela que Sobrinho chegou a acusar os colegas de Lisboa de ignorância e insensibilidade, lembrando-lhes que não percebiam como se faziam negócios em Angola e que era na presença de Ricardo Salgado que tudo ficava decidido em Lisboa: "Recordo que, na última reunião que tivemos na sede do BES, ficou claro para mim que bastava informar toda a exposição da Escom em Angola, mesmo aquela onde tinha outros parceiros, que a situação ficaria ultrapassada".

Durante anos, as trocas de emails entre altos quadros do BES e do BESA eram constantes e quase parecia que viviam numa guerra contínua e em que ninguém se entendia. Muitas vezes, o BESA nem sequer respondia às dúvidas ou aos pedidos de informações da sede de Lisboa, conforme se pode confirmar em numerosas mensagens electrónicas a que a SÁBADO teve acesso e que publica em exclusivo na edição desta semana.

São precisamente estas mensagens e o conteúdo das centenas de documentos que constam no processo de contra-ordenação do BdP que indiciam que o BESA terá entrado em descontrolo total até ser nacionalizado em Outubro de 2014 pelo Presidente da República de Angola, José Eduardo dos Santos. Só em financiamentos ao BESA o BES terá perdido cerca de 5 mil milhões de dólares.

Esta semana, a SÁBADO revela-lhe tudo sobre o banco negro, a começar pelo conteúdo das 300 páginas da Auditoria Especial WB2 da consultora Deloitte. Feita a pedido do Banco de Portugal (BdP) no âmbito do Processo de Contraordenação 87/14/CO e concluída em Março de 2015, é a partir dos resultados cruzados desta auditoria com o despacho de acusação do BdP (que exige até dois milhões de euros de coima a Salgado, entre outros acusados) e pelo menos 12 inquirições de altos quadros do BES – documentos a que a SÁBADO teve acesso integral –, que é descrito o já referido cenário de descontrolo geral no BESA.

Todos estes dados já foram enviados ao Ministério Público (MP), porque abrem a porta a eventuais responsabilidades criminais de gestão danosa, infidelidade e branqueamento de capitais de administradores do BES, como Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires, que formalmente deveriam mandar no BESA a partir de Lisboa. E também de Álvaro Sobrinho, que comandou o BESA durante cerca de 10 anos transformando-o no mais influente banco privado a operar em Angola. Mas antes de se perceber que o BESA tinha afinal muitos milhões de euros de créditos incobráveis a clientes.

SABADO

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